São Paulo, terça-feira, 26 de setembro de 1995
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Olimpíada se transformou em mercadoria

ANDRÉ FONTENELLE
DA REPORTAGEM LOCAL

O Comitê Olímpico Internacional se transformou em uma empresa com fins lucrativos. A mercadoria que comercializa são os Jogos Olímpicos.
Reunido ontem em Lausanne (Suíça), tomou mais uma medida que lhe garante bons rendimentos no futuro: reduziu de 60% para 49% a cota que os organizadores de Jogos Olímpicos receberão pela transmissão de TV.
A maior parte dessa dedução ficará com o COI. A redistribuição arbitrária do faturamento só entrará em vigor a partir da Olimpíada de 2004 -que o Rio se propõe a abrigar. Se a medida já valesse para os Jogos de Atlanta, significaria uma perda de cerca de US$ 90 milhões para o Comitê Organizador.
"Financiar investimentos nas cidades que abrigam os Jogos não é uma das metas do movimento olímpico", justificou François Carrard, diretor-geral. Cuide-se o Rio, se pensa em revitalizar bairros decaídos abrigando a Olimpíada.
Não satisfeito, o Comitê, que já goza de isenção de impostos federais na Suíça, anunciou ontem que não quer pagar um novo imposto sobre transações comerciais, criado neste ano. "Não é questão de economia, mas de complicações burocráticas", assegurou Carrard. Imaginem se o exemplo for seguido.
A fortuna amealhada pelo COI não é revertida em benefício do esporte, mas dos cofres da própria entidade.
As federações internacionais de cada esporte esbravejaram e obtiveram uma pequena concessão do espanhol Juan Antonio Samaranch, presidente do COI.
Nos Jogos de Atlanta, cada uma delas receberá US$ 1 milhão. Parece muito, mas, somadas, ficarão com apenas 1,7% do faturamento previsto dos Jogos.
A migalha oferecida por Samaranch, porém, dificilmente se estenderá aos atletas. O presidente do COI não aprecia a idéia de se pagarem prêmios aos campeões olímpicos. "A medalha de ouro já atrai ajudas indiretas", alega.
Não falta dinheiro, no entanto, para o conforto dos dirigentes do COI. Como já ocorrera em Barcelona, eles reservaram, para o período dos Jogos de Atlanta, todos os quartos do Marriott Marquis, um dos hotéis mais caros da cidade.
A visão comercial do Comitê Olímpico fica evidente no calendário dos Jogos do próximo ano. Foram eliminadas provas de esportes tradicionais -como o remo, que não terá o dois com timoneiro.
Por outro lado, foi incluído nos Jogos um esporte incipiente como o vôlei de praia, que só é praticado seriamente em dois países -Brasil e EUA-, com uma dupla daqui e outra dali.
Isso não significa que se deva retornar ao amadorismo hipócrita do passado. Por muito tempo, empresas ganharam dinheiro nas costas dos atletas.
O profissionalismo é inevitável para que o esporte de alto nível não fique restrito a uma elite. Mas não pode ser instrumento para que essa mesma elite se sirva do lucro que a Olimpíada proporciona.

Hoje, excepcionalmente, não publicamos a coluna de MATINAS SUZUKI JR.

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