São Paulo, quarta-feira, 27 de setembro de 1995
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Os limites do possível

ANTONIO DELFIM NETTO

Há 20 anos, os economistas Pedro Malan e R. Bonelli publicaram um interessante artigo, que terminava com o seguinte parágrafo: "Atualmente, como no passado, os fenômenos recorrentes de desequilíbrio no balanço de pagamentos e aceleração da inflação estão expressando não tanto erros de política econômica passada ou incompetência em sua formulação atual, como querem alguns, mas, antes, fenômenos reais associados às características do processo de formação de capital em uma estrutura econômica desequilibrada, como ainda é o caso do Brasil. É imperioso aprofundar a questão para além das querelas "técnico-acadêmicas" acerca de erros e acertos de política econômica de curto prazo, na direção de um esforço por captar certas características estruturais da economia brasileira (e sua associada superestrutura política), que hoje, como no passado, configuram os (estreitos) limites do possível em termos de opções de política econômica" ("Os limites do possível", in Pesquisa e Planejamento Econômico, volume 6, nº 2, agosto de 1976).
É claro que o dilema não se restringia ao Brasil. O processo de desenvolvimento é a arte de manter uma taxa de crescimento elevada sem criar desequilíbrio interno (inflação) ou desequilíbrio externo (manter o déficit em conta corrente bem financiado e dentro de limites aceitos pelo mercado). É isso que caracteriza os "limites do possível".
É desse ponto de vista que nos parece que as divergências entre a política de curto prazo e os objetivos de longo prazo do atual governo devem ser discutidas para além das querelas "técnico-acadêmicas".
Não se trata apenas de apontar erros na política econômica de curto prazo, mas de chamar a atenção para o fato de que ela condiciona um crescimento de longo prazo inadequado, incapaz de satisfazer às necessidades básicas da população. Em particular, a mais básica das necessidades, que é a criação de emprego.
Se o desemprego, segundo o próprio governo, é o mais grave de nossos problemas; se vemos nele a destruição da família, a alienação da cidadania e o afloramento de uma sociedade anômica, então não é possível conformar-se passivamente com a perspectiva de que vamos crescer entre 4% e 5% nos próximos cinco anos, como se sugere no Plano Plurianual, porque existem instrumentos para superar as restrições ao crescimento, com equilíbrio interno e externo.
O problema não é o de que podemos crescer 3% "per capita" ao ano. O problema é que o desemprego só pode ser reduzido se a taxa de crescimento do PIB for maior do que a soma da taxa de crescimento da oferta do trabalho com a taxa de crescimento da produtividade do trabalho. E essa soma é certamente maior do que 5%.
É preciso repensar a questão. Os economistas não existem apenas para reconhecer os "limites do possível", o que é muito importante, mas para sugerir políticas estruturais que possam levá-los mais longe, com equilíbrio interno e externo.

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