São Paulo, sexta-feira, 29 de setembro de 1995
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Hargreaves mediou transferência da Record

ELVIS CESAR BONASSA
DA REPORTAGEM LOCAL

O ex-chefe da Casa Civil Henrique Hargreaves foi um dos padrinhos da autorização oficial para a Rede Record ser transferida definitivamente para o bispo Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus, em fevereiro de 1994.
A autorização foi assinada pelo então presidente Itamar Franco em 23 de fevereiro de 94. No mesmo dia, era aprovada no Congresso a criação do Fundo Social de Emergência, primeiro passo do Plano Real e da candidatura de Fernando Henrique Cardoso à Presidência.
A Folha procurou Hargreaves para que se manifestasse sobre a transferência da Record. Contactado, ele exigiu que as perguntas fossem feitas por escrito: um questionário foi enviado a Hargreaves em Lisboa. À pergunta "qual foi sua participação na venda da TV Record à Igreja Universal do Reino de Deus?", respondeu: "Nunca tratei de venda de emissora".
A transferência definitiva da Record -que pertencia a Silvio Santos- para Edir Macedo começou a tramitar em 1991. O processo, nº 29100.000476/91, estava emperrado no Ministério das Comunicações, porque a área de fiscalização do ministério apontava irregularidades no caso.
No segundo semestre de 93, a Comissão de Comunicação da Câmara recebeu documentos mostrando que a Record ainda estava em nome de Silvio Santos. Com isso, a comissão poderia barrar futuras renovações da concessão da Record. A partir daí, o deputado Laprovita Vieira (PPB-RJ), cuidando dos interesses de Macedo, fez contatos com o governo para obter a transferência definitiva.
Seu interlocutor privilegiado foi Hargreaves, que encampou a causa. A pedido dele, o Ministério das Comunicações desengavetou o processo. Foi feito um parecer jurídico que desconsiderava irregularidades apontadas pelos fiscais.
Esse parecer abria caminho para levar o caso a Itamar e obter a transferência definitiva. Mas, pressionado por denúncias da CPI do Orçamento, Hargreaves se afastou do cargo em 30 de outubro de 93.
Como as investigações da CPI não o inculparam, Hargreaves reassumiu o Gabinete Civil em 8 de fevereiro de 94. Voltou ao Planalto e ressuscitou o caso, em um momento propício para convencer Itamar Franco: a votação do FSE.
No mesmo dia em que Hargreaves reassumiu o cargo, o FSE foi votado em primeiro turno. Mas, por se tratar de emenda constitucional, seria necessário um segundo turno. Nos dias que se seguiram, houve ameaças de apresentação de emendas e mesmo voto contrário por partidos que pediam maior participação no governo.
Hargreaves levou a Itamar a avaliação de que a solução do caso Record garantiria os votos dos evangélicos para o FSE. Com isso, contava obter a adesão do presidente para um caso ao qual ele, Hargreaves, já se dedicava havia meses. Obteve êxito.
Itamar acatou a avaliação. No dia da votação do segundo turno, 23 de fevereiro, assinou a transferência definitiva. A bancada evangélica (30 parlamentares) votou em peso a favor do FSE, e a Record passou para Edir Macedo.
O deputado Laprovita Vieira (PPB-RJ) também nega a existência de negociações políticas para a aprovação da transferência da Record.

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