São Paulo, sexta-feira, 29 de setembro de 1995
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A poluição de Maluf

LUÍS NASSIF

Não tem lógica a licitação montada pela Prefeitura de São Paulo visando conferir a uma única empresa -a Vega Sopave- o monopólio da fiscalização de emissões de poluentes dos veículos licenciados na capital. Não tem lógica por várias razões.
Em Nova York, a certificação é feita pela rede de oficinas autorizadas. O Estado credencia redes de concessionárias, que cobram preços ínfimos pelos testes. Não apenas analisam os poluentes, como fazem a vistoria completa. Conferem pneus, luzes, freios e alinhamento de rodas. Enfim, serviço completo a preços módicos.
O trabalho dessas oficinas é acompanhado por fiscalização. E, em cada acidente, conferem-se as condições gerais do veículo. Qualquer evidência de que não foi feito trabalho sério de vistoria resulta em punições pesadíssimas para a oficina credenciadora.
Um aparelho para verificar emissões não deve custar mais do que US$ 1.000 -e não US$ 40 mil, como foi noticiado. Há uma enorme estrutura de concessionárias e oficinas autorizadas já instaladas na cidade de São Paulo. Recentemente, a própria Volkswagen ofereceu testes gratuitos de cálculo de emissão de poluentes para todos os automóveis da marca, por intermédio de sua rede de concessionárias.
Em vez desse sistema prático, concorrencial e não monopolizado, o prefeito Paulo Maluf opta por mais uma solução suspeita. Monta um monopólio e o confere a uma empresa que não dispõe de nenhuma especialização no setor, ligada a uma construtora que tem levado todas as licitações da prefeitura -e que participou do financiamento do esquema Paubrasil.
Em vez de vistoria completa, o dono do veículo vai pagar uma taxa alta exclusivamente para conferir a emissão de poluentes. O que equivale a montar um gabinete dentário de última geração apenas para tratar dos caninos dos pacientes.
Há um mau cheiro no ar que, seguramente, não é de poluentes químicos.
Caso Fiat
O episódio Cetesb-Fiat necessita de mais esclarecimentos. A Fiat julga estar sendo vítima de uma conspiração da concorrência. Pode ser exagero, mas, de qualquer modo, há procedimentos que precisam ser esclarecidos.
Há dois anos, a Cetesb realizou oito testes com determinado motor da Fiat, analisando seu teor de poluição para o Ibama. Após a aprovação nos testes, venderam-se 500 mil automóveis movidos pelo tal motor.
Em abril, técnicos da Cetesb realizaram espontaneamente novos testes e constataram divergências com os testes iniciais. O que alimentou as suspeitas da Fiat acerca do suposto uso político do órgão foram as seguintes evidências:
1) A Cetesb é órgão de análise técnica que, nos testes em motores, trabalha contratado pelo Ibama. Ao constatar as irregularidades na emissão de poluentes, em vez de chamar a Fiat para se explicar, a Cetesb elaborou um relatório que vazou para a imprensa antes de chegar ao destinatário, o Ibama.
2) A Cetesb é como um laboratório de análise médica. Cabe-lhe aplicar os testes e relatar os resultados técnicos. Depois, compete ao médico analisar os resultados e recomendar o tratamento (ou, no caso do Ibama, definir a punição, obviamente após um processo no qual as partes são ouvidas). O relatório em questão fugiu do habitual e sugere, inclusive, punições para a empresa. O que acaba conferindo uma clara conotação política ao relatório.
É provável que a Cetesb esteja coberta de razão quanto aos aspectos técnicos do episódio. É possível que não. Mas são outros quinhentos.
O que importa é que a Cetesb é uma instituição de ótima reputação que, até para resguardar seu bom nome, precisa demonstrar à opinião pública que não houve parcialidade no episódio.

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