São Paulo, segunda-feira, 1 de janeiro de 1996
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Lista de ano novo

JOÃO SAYAD

Parece pretensioso, mas é irresistível a tentação de fazer uma lista de ano novo para o presidente da República.
1) Não fazer piadinhas na frente de repórteres. São ótimas, mas, como a imprensa quer vender jornais, viram problemas políticos.
2) Não dar entrevista coletiva em "off".
3) Esquecer o problema da inflação. Está indo muito bem. Deixar o Banco Central e os ministros econômicos irem tocando o Plano Real. Chamar todos da equipe econômica e dar ordem definitiva para que parem de brigar pela imprensa, colocando a Secretaria de Assuntos Estratégicos encarregada de vigiar ministros, assessores e diretores do Banco Central. Pedir autorização à Justiça para grampear o telefone de todos, para ter certeza de que não vão dar matérias para jornalistas abelhudos.
4) Única tarefa na estabilização da economia: conversar com algum economista criativo para saber como incentivar as exportações sem mexer no câmbio e melhorar o perfil da dívida pública.
Se não houver jeito de incentivar as exportações, esperar a economia convalescer mais longamente da indexação e discutir correção do câmbio mais rápida só em 1997, se tudo estiver bem. É assunto para a lista de ano novo do ano que vem.
5) Política industrial: arranjar outro nome para o problema, para evitar discussão sem sentido com "neoliberais", mas discutir e implementar rapidamente ação governamental para criar canais de comunicação entre governo, indústria e comércio. Trazer experiência da Coréia e da Malásia, onde estive recentemente. Chamar o Itamaraty, a Fazenda e o Planejamento e exigir uma administração correta dessa política de abertura.
Por enquanto, estamos entregando tudo, sem nenhum cuidado com "dumping", importações pelo correio sem impostos, contrabando de zonas francas do Mercosul etc. Exigir solução até março.
6) Reforma da Previdência: "mon Dieu de la France!" Que problema complicado. Pensar na idéia de incentivar fortemente a previdência privada antes de reformar a pública. Estudar a hipótese de a nova previdência privada cobrir custos dos aposentados atuais e seus direitos. Há estudos do setor segurador e previdenciário que mostram que essa solução é viável.
7) Orçar uma boa verba, tipo "Brasil Grande", e discutir áreas prioritárias com os ministros não-econômicos.
8) Tenho só mais três anos de mandato. Que vou fazer na área da educação? Não basta mexer com merenda, horário escolar, escolas com orçamento próprio. Pensar em ação renovadora importante.
8.1) Chamar meus amigos da universidade e montar em algum lugar do país uma universidade-padrão, com os melhores professores brasileiros e quantos bons professores estrangeiros forem necessários, sem os problemas de direitos adquiridos e burocracia das universidades existentes. Os professores russos estão ganhando salários muito baixos, mesmo se comparados com os brasileiros. Onde colocar essa universidade? Rio? Brasília de novo? Nordeste? Onde está o professor Zeferino Vaz, fundador da Universidade de Campinas?
9) Privatização na área de transportes é muito importante, por causa das exportações. Como viabilizar transporte do Centro-Oeste e do Norte para os portos brasileiros? Como fazer funcionar as hidrovias Paraná-Uruguai, os rios Tocantins e Araguaia? Ação prioritária. Não esquecer. Discutir logo em janeiro.
10) Conversar com o Ministro das Comunicações. As teles correm o risco de ficar obsoletas por causa das novas tecnologias. A privatização é prioritária nessa área e não na Vale, que vai muito bem, obrigado.
11) Na área social, o que fazer? Difícil, mas muito importante.
11.1) Por enquanto, alocar verba importante e significativa para a reforma agrária.
11.2) Pensar em programa nacional de segurança e combate à violência. Pedir apoio internacional e pensar grande.
12) As cidades brasileiras estão crescendo e se expandindo no espírito absoluto do "laissez-faire". Discutir uma lei de reforma urbana nacional. Não adianta deixar para o poder local, que está perdido com pequenos problemas, passarelas para pedestres e viadutos desordenados. Criar o Instituto Haussman de Planejamento Urbano para discutir o assunto.
13) Nadar todos os dias. Passar dos 500 metros por dia para 1.000 metros por dia até fevereiro.
14) Respeitar feriados e dias santos de guarda. Evitar repórteres, conversas de governo e fofocas.

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