São Paulo, sexta-feira, 5 de janeiro de 1996
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O novo pecado

JOSIAS DE SOUZA

BRASÍLIA - Todos têm a sua época. O funcionário público também teve a sua. Foi num Brasil de três, quatro décadas atrás.
Não havia melhor emprego. As repartições remuneravam bem e ofereciam estabilidade. Dizia-se que era ocupação para toda a vida.
Contam-me funcionários da velha guarda que até nas festinhas o barnabé levava a melhor. Ficava com as moças mais vistosas. Era o que se costumava chamar de um partidão. Nada a ver com o velho pecebão, bem entendido.
Dava-se melhor ainda o funcionário que envergasse uniforme. Para as moças de então, o cadete representava, por assim dizer, uma janela para o futuro. Era um bilhete premiado. O mesmo valia para o funcionário do Banco do Brasil.
São histórias do passado. O funcionário de hoje não é nem a caricatura do de ontem. O BB está mal das pernas. Acaba de sair de um programa de demissões voluntárias. As Forças Armadas proletarizaram-se.
O resto do funcionalismo perdeu o respeito do cidadão. Não entro no mérito. Não digo se está certo ou errado. Apenas registro um fato. Ao funcionário de hoje restou pouco.
Tratam-no como Nossa Senhora em culto da Universal. Na base do chute. Arrancaram-lhe até o direito à dúvida. Não há, no seu caso, meio-termo.
Quando não é acusado de incompetente é chamado de marajá ou pilantra. Para dizer o mínimo. Eram sete os pecados capitais. Agora há mais um: ser funcionário público.
Falo do funcionário porque os economistas do governo sugeriram a Fernando Henrique que cancele o aumento do funcionalismo. Algo, antes, sagrado. Pingava todo janeiro, data-base da categoria.
A alternativa ao reajuste zero também é ridícula: 10,84%. Um percentual que não tira ninguém da dureza. Mas abre nos cofres de Brasília um rombo do tamanho de R$ 4,4 bilhões. É muito dinheiro para um caixa que fechou 95 deficitário.
Chegou-se ao pior dos mundos: o grosso do funcionalismo ganha mal, o governo gasta os tubos -foram R$ 39,5 bilhões no ano passado- e o contribuinte dispõe de um serviço de quinta sempre que recorre a um guichê do governo. É preciso fazer algo. Correndo.

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