São Paulo, domingo, 7 de janeiro de 1996 |
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Não dito e não feito
DALMO MAGNO DEFENSOR
Sempre bem-humorada, Rose costuma me despertar e me acompanha no trajeto casa/escritório, dando notícias, informando a hora certa e anunciando músicas que, no geral, aprecio. Certa segunda-feira, Rose me pregou uma peça: me acordou tocando "I Got You Babe", com Sonny & Cher. Para quem não se lembra, é a mesma música que acorda o "homem do tempo" Phil Connors (Bill Murray), no filme "O Feitiço do Tempo", indicando -para seu desespero- que ele está vivendo novamente o mesmíssimo dia. Na época, eu tinha o filme fresquinho na memória, pois a HBO o estava exibindo toda semana. Ouvindo a música, lembrei-me do filme, mas felizmente não houve tempo para aflição: vinha da cozinha um barulho de louça e de torneira aberta, denunciando a presença da empregada; não podia ser domingo novamente. No entanto, não lhe telefonei. Um pouco por timidez, mas principalmente pelo pensamento de que "não tem nada a ver", que costuma restringir ao campo das intenções quase todas as gentilezas, ou manifestos de admiração, que pensamos fazer a estranhos. Dessa forma, o telefonema não dado a Rose acabou incorporado à minha coleção de "não-contatos" com a mídia, onde, se é consolo, ao menos repousa em boa companhia. Ali estão, por exemplo, os cartões que teriam acompanhado as flores que não mandei para Regina Casé, nos dias seguintes a cada exibição do "Brasil Legal"; o fax que não redigi para o pessoal da "Casseta & Planeta", depois da hilariante paródia de "Explode Coração", e os abraços jamais dados no Veríssimo e nos atores de "Comédia da Vida Privada". Amarela de vários anos, há uma carta de pai satisfeito à TV Cultura, por encantar minha filha com sua programação infantil; há inclusive, um pedido para reexibição do "Sítio do Pica-Pau Amarelo", não formulado, mas atendido. Redigidas em inglês sofrível, mas bem-intencionado, tenho minutas de telegrama aos gringos que fizeram "Anos Incríveis", "Os Simpsons", e (estas, já emboloradas) "Jornada nas Estrelas" e "Manda Chuva". Há mais, certamente; citei apenas alguns exemplares volumosos. Existe, também a "anticoleção", onde jazem reclamações esquecidas e indignações não expressadas, mas confesso que não gosto de examiná-las. Chego, finalmente, aonde queria: agradeço aos leitores que, tendo pensado em escrever para o "Da Poltrona", acharam que "tinha a ver" e passaram da intenção à prática. A leitura das cartas, elogiosas ou detonadoras, me fornece preciosos subsídios na busca de melhor postura para a coluna: é a "ortopedia epistolar". Àqueles que "apenas" lêem a coluna, agradeço igualmente; afinal, há os "fluidos" - não é, Rose? A todos, feliz restante de Ano Novo. Texto Anterior: TV deveria ensinar história; "Onde foi parar 'O Quinteto'" Próximo Texto: Cláudia Raia é melhor que "Não Fuja da Raia" Índice |
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