São Paulo, segunda-feira, 8 de janeiro de 1996
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Universal cobra por bilhete mais que ônibus comum

Orientados pelos pastores, fiéis ignoram provocações

GEORGE ALONSO; LUCIO VAZ
DA REPORTAGEM LOCAL E DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Nada é de graça na Igreja Universal do Reino de Deus: R$ 2 foi o preço que cada fiel pagou para ir de ônibus fretado pela igreja às manifestações em São Paulo e Brasília. A passagem de ônibus custa R$ 0,65 na capital paulista. No Distrito Federal, a viagem mais cara custa R$ 0,95.
Os fiéis pagaram e ainda levaram, ao Vale do Anhangabaú (centro de São Paulo), a faixa "Ninguém pode dizer o que fazemos com o nosso dinheiro". Mas, no caminho, muitos foram alvo de ironias de pedestres.
"Onde essa gente vai? Ainda se fosse para construir casas", gritou um homem em um bar próximo à av. 23 de Maio. Uma senhora evangélica, que ouviu a provocação, riu. Outro pedestre, no ponto de ônibus, disparou: "Dá os 10% pra mim".
Quase na esquina da rua Líbero Badaró, vizinha ao vale, uma loja de discos aproveitou a passagem dos fiéis, com bandeirinhas da Universal, e tocou o sucesso carnavalesco "Xô Satanás", sátira aos evangélicos.
Os fiéis não reagiram nem quando, ao "lê-leleô, leleô, Jesus!", um grupo de pessoas no Viaduto do Chá completou "Corinthians, Corinthians!".
Nos templos, os pastores orientaram os fiéis para não falar de doações, do vídeo veiculado na Rede Globo e não aceitar possíveis "provocações" de "infiltrados" pela Rede Globo.
No templo em Ceilândia (cidade-satélite de Brasília), nos preparativos da ida à Esplanada dos Ministérios, o pastor Marcelo Santos alertou 400 fiéis.
"Vamos ficar atentos. A Globo pode infiltrar gente para tumultuar. Eles querem passar a imagem de que somos violentos. Não aceite provocações", disse.
Ele afirmou ainda que obreiros estariam com câmeras de vídeo e que os fiéis deveriam apontar suspeitos para que fossem filmados. Pediu também que evitassem repórteres.
Em São Paulo, ônibus levavam faixas contra a Rede Globo ("TV Globo, nada a ver"). No Anhangabaú, surgiu outro apelo, político, em faixa: "O povo evangélico confia em FHC".
Em Ceilândia, faltou dinheiro, segundo Santos, para pagar 35 ônibus fretados por R$ 2,6 mil. Ele organizou uma coleta.
"Temos só R$ 1,4 mil. Quem puder dar R$ 1, dá. Quem tem prosperado, com a ajuda de Deus, pode dar R$ 50, R$ 100. Vamos colocar ali, em cima da Bíblia", pediu. A maioria contribuiu com notas de R$ 1.
Tanto em São Paulo como em Brasília, os seguidores da Universal cantaram hinos religiosos no trajeto até os locais dos atos.
Anonimamente, a Folha foi aos atos em Brasília e São Paulo nos ônibus da Universal.
A expectativa da Universal de reunir 850 mil fiéis em todo o país não se confirmou. Em São Paulo, eram esperadas 300 mil pessoas. Segundo a Polícia Militar, foram 80 mil. Em Brasília, foram 5.000 e, no Rio, 15 mil, sempre de acordo com a PM.
Detidos
Ontem, em Belo Horizonte o funcionário público Moisés Augusto Gonçalves, 46, foi preso e liberado em seguida, depois de entra na sede da Universal fantasiado de capeta. José Aparecido de Oliveira também foi preso por tumultuar um culto da Universal, desta vez no centro de Belo Horizonte. Foi detido por xingar os pastores e gritar "Xô, Satanás".
(George Alonso e Lucio Vaz)

Colaborou a Agência Folha

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