São Paulo, sábado, 13 de janeiro de 1996
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Gil diz que é 'tio' da noite reggae do festival

FERNANDA DA ESCÓSSIA
DA SUCURSAL DO RIO

A uma semana de sua apresentação no Hollywood Rock, o cantor e compositor Gilberto Gil diz que se sente como o "tio" que vai juntar Carlinhos Brown, Lobão e Fernanda Abreu num som afro-brasileiro-caribenho.
"Sinto-me meio decano, um tio mais velho dessa turma. E isso sem nenhum problema, já vou fazer 54 anos. Vamos fazer a escolinha do professor Gil", diz, numa referência à "Escolinha do Professor Raimundo", de Chyco Anísio.
Gil e seus convidados encerram a noite reggae do festival, no dia 19, em São Paulo, e no dia 29, no Rio. Antes deles, apresentam-se Chico Science & Nação Zumbi, Cidade Negra, Steel Pulse e Aswad.
Gil diz que a característica comum de seus convidados é a batida rítmica, misturando as raízes do batuque baiano, do samba-funk carioca, do rock e da MPB, numa fusão que homenageia o reggae de origem jamaicana.
"O Brown é a própria timbalada, o som baiano. Fernandinha tem a batida da rua carioca, do funk, do pancadão. E Lobão, o mais roqueiro de todos, foi o primeiro a reclamar da ortodoxia da música. É o nosso coringa", disse.
Gil abre o show com reggaes que considera obrigatórios em seu repertório, como "Não Chore Mais" -sua versão para a música cantada por Bob Marley-, "Vamos fugir", "Barracos" e "Oração pela Libertação da África".
Ele chamará os convidados, e cada um deles cantará duas canções próprias. Gil vai tocar guitarra para Lobão e fará backing vocal para Fernanda Abreu. Todos cantarão juntos um número final.
Gil planeja mostrar também canções do novo disco, em fase de gravação. Uma delas é o reggae "Guerra Santa", sobre os desentendimentos entre católicos e adeptos da Igreja Universal do Reino de Deus.
Nos ensaios, Gil e Lobão fizeram um arranjo reggae para o rock "Me Chama", um dos números de Lobão. Ele também cantará, em versão reggae, "Radio Blá". "Eu aumentei o tempo de 'Me Chama', porque ela é um clássico nosso", diz Gil.
Lobão diz que vê uma identidade comum a todos os integrantes da banda -ainda sem nome-, graças à multiplicidade de ritmos da música brasileira. Diz que Gil é "um tio muito pra frentex" e planeja surpresas para o show.
Sob a direção de Gil, parece ter chegado ao fim o suposto desentendimento entre Lobão e Fernanda Abreu. O roqueiro diz que nunca fez as declarações que lhe foram atribuídas, criticando o trabalho e o disco de Fernanda.
"Eu a Fernandinha tocamos juntos na Blitz, somos amigos. Temos intimidade até para que eu diga pessoalmente a ela qualquer coisa", disse Lobão. Ele encontra Fernanda nesta semana para ensaiar para o Hollywood Rock.
O roqueiro diz que está vivendo uma fase tranquila, pós-morbidez e pós-ansiedade. Gosta da definição de Gil, que o cumprimentou por ter encontrado "o caminho do meio", o equilíbrio.
Principal atração da noite, Gil diz que a presença de um show reggae, com destaque para os brasileiros, é uma conquista para o artista nacional e revela uma tendência crescente de fusão de ritmos que atrai o público jovem.
"O Hollywood Rock deixou de ser só rock, como muitos festivais incorporaram novos ritmos. Isso é muito bom. Até porque o rock abriu caminho para o reggae e todos os outros sons. O rock permitiu tudo", afirma Gil.
Ele diz que não sentiu, neste festival, discriminação contra os artistas brasileiros. "Saí do segundo 'Rock in Rio' por problemas de espaço no palco e diferença de tratamento. Esse é um mito dos festivais brasileiros, mas parece que ficou no passado", afirma.
Gil volta ao Hollywood Rock seis anos depois que seu filho Pedro Gil, durante um festival, morreu em acidente automobilístico. "Não tem problema. A dor foi grande, mas essa será mais uma homenagem a ele", afirma.

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