São Paulo, domingo, 14 de janeiro de 1996
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Brasil e China vão ao céu

JAIME SPITZCOVSKY
DE PEQUIM

Brasil e China expandem seu programa conjunto de construção e lançamento de satélites de sensoriamento remoto para conquistar uma fatia do mercado de venda e uso de imagens do planeta produzidas desde a órbita terrestre.
No mês passado, em visita a Pequim, o presidente Fernando Henrique Cardoso assinou documentos para expandir de dois para quatro satélites o principal programa de cooperação em alta tecnologia entre os dois países.
Os satélites de sensoriamento remoto coletam imagens que são usadas, por exemplo, para monitorar questões ambientais e agrícolas. Para países de dimensões continentais, como Brasil e China, o uso desse material se reveste de especial importância para definição de políticas para ecologia e agricultura.
Mas Brasil e China não querem ser apenas usuários do seu programa conjunto, deslanchado em 1988. Querem ser vendedores, oferecendo as imagens, e alterar o perfil desse mercado, hoje dominado por norte-americanos e europeus.
O primeiro satélite, atualmente em montagem em Pequim, será lançado em 1997, a partir de solo chinês. O segundo lançamento, também na China, deve ocorrer em 1999, enquanto os dois outros resultados da parceria sino-brasileiro entrarão em órbita no próximo século, em data a ser definida.
A China está representada pela Academia Chinesa de Tecnologia Espacial, e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais personifica o Brasil. Seu diretor, Marcio Nogueira Barbosa, esteve em Pequim durante a visita de Fernando Henrique e falou à Folha.
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Folha - Qual o significado da expansão do programa de produção de satélites?
Marcio Nogueira Barbosa - Hoje, no mundo, dominam esse setor de produção de imagem os EUA e a Europa, que possuem sistemas operando há vários anos.
Existem também iniciativas japonesas, canadenses e da Índia. Nosso programa de cooperação, no momento em que é expandido para mais dois satélites, visa à possibilidade de ser instrumento de inserção do Brasil no mercado mundial de imagens de satélites.
Um ou dois satélites não são suficientes para garantir continuidade no mercado.
Portanto a expansão, com a criação de mais dois satélites, sinaliza aos potenciais clientes que estamos pensando em longo prazo, ou seja, que o serviço não terá vida curta. Isso é importante para dar segurança ao usuário.
Folha - Como é possível quantificar o mercado de utilização de imagens de satélites?
Nogueira Barbosa - O mercado de uso de imagens e seus derivados, como interpretação e mapeamento, foi avaliado, há alguns anos, em US$ 6 bilhões anuais.
Mas o mercado está se expandindo, a tecnologia tem avançado, permitindo outras aplicações e tarefas. Por exemplo, as imagens do satélite podem agora ser usadas para questões de planejamento urbano, que antes usavam apenas imagens feitas de um avião.
Folha - Em que fase de desenvolvimento estão os projetos dos dois novos satélites?
Nogueira Barbosa - Brasil e China iniciaram a fase de definir claramente como serão os dois novos satélites, buscando prepará-los para o mercado que vai existir depois do ano 2000.
Queremos entrar na nova década com capacidade de oferecer um produto competitivo, que seja o melhor e o mais atualizado.
Folha - Quem são os clientes potenciais?
Nogueira Barbosa - São agências e organizações preocupadas com questões ambientais, países pobres em cartografia, geralmente da África e da América Latina. Existe também interesse de entidades da área de engenharia civil e obras.
Folha - O que o Brasil aproveita dos conhecimentos chineses nesse programa de cooperação?
Nogueira Barbosa - O Brasil ganha a chance de desenvolver tecnologias que eram disponíveis em nossos programas em casa.
Essas se caracterizam por desenvolver satélites pequenos, entre 150 e 200 quilos. Mas agora desenvolvemos um satélite de 1,5 tonelada, o que exige uma engenharia diferente.
Se o Brasil quiser, por exemplo, desenvolver um satélite de comunicação, que é de grande porte, poderá usar essa experiência que adquirimos na China.
Folha - E a China, o que aprende com o Brasil?
Nogueira Barbosa - Os chineses ganham em dois aspectos. Primeiro, aprendem técnicas de gerenciamento, documentação, ferramentas que eles conhecem pouco e que são necessárias atualmente para ganhar competitividade. E, aprendendo o método de trabalho, a China tem chances de melhorar o lado operacional.
Em segundo lugar, vem o aspecto da utilização dos satélites. O Brasil é um dos grandes usuários do mundo, e a China usa satélites basicamente para questões de defesa. Nós temos 20 anos de experiência na utilização das imagens de satélites para assuntos agrícolas, de meio ambiente.

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