São Paulo, domingo, 21 de janeiro de 1996
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Góticos 'vibram' com show de The Cure

MARIANA SCALZO
DA REPORTAGEM LOCAL

O Hollywood Rock 96 termina hoje com a apresentação do The Cure. A banda inglesa fecha a noite que também terá shows do brasileiro Pato Fu e dos internacionais Supergrass, White Zombie e Smashing Pumpkins.
A partir desta sexta até o próximo domingo, o festival será apresentado no Maracanãzinho, no Rio de Janeiro.
A volta do The Cure ao Brasil -o grupo esteve no país em 1987- realiza o sonho da nova geração de góticos, que na época era pequena demais para acompanhar os shows da turma do vocalista de cabelos arrepiados Robert Smith.
Como nos anos 80, essa nova geração encontra nos livros de Charles Baudelaire (poeta francês do século 19, precursor da poesia moderna) sua bíblia e na atmosfera das obras do escritor norte-americano Edgard Alan Poe (também do século 19) seu cenário ideal.
Atualmente, os góticos, darks e deprimidos, em geral, costumam se encontrar de sexta à noite até o domingo para dançar no Espaço Retrô. A danceteria, que fica em Santa Cecília (zona oeste de São Paulo) já havia sido ponto de encontro de góticos mais antigos.
O preto continua a ser a cor predominante nas roupas e as músicas com letras "down" compõem sua trilha sonora.
Fernanda Gutierrez, 18, tinha nove anos quando o grupo veio ao Brasil pela primeira vez.
Ela conheceu a banda em 1989, dois anos depois do show, e garante que sua vida se transformou.
"Influenciou o modo de me vestir e minhas amizades." A inspiração gótica também pesou no lado sentimental", disse Fernanda.
"Quando o vi com os cabelos arrepiados, batom roxo e uma camiseta do Cure, fiquei perdidamente apaixonada", conta a estudante. Ela namora Paulo de Tarso, 20, há três anos.
Os dois largaram emprego em São José do Rio Preto (451 km de São Paulo) para ver o show do The Cure. "Na nossa cidade quase ninguém é assim. Fizemos um evento no Carnaval de 1995. Alugamos uma boite só para rolar Gotic Rock e The Cure, claro. Foi o máximo. Isso é nossa ideologia, nosso estilo", diz Fernanda.
"É uma identificação com a noite e seus mistérios", diz Sandra Meira, 20. "A alma gótica é relativa ao sentimento."
Corina Camizão, 19 anos, concorda que o importante é a alma. "Alma tétrica, que é não conseguir se identificar com o que acontece a sua volta e se fechar em seu mundo. É um estado de espírito."
Fanática pelo The Cure, assim que soube da confirmação do show pelos jornais, Corina saiu avisando todos os amigos.
O mineiro Marcos "Smith", 21, recém-formado técnico de contabilidade, veio de Itaúna. "O grupo é crítico e observador."
O estudante Panais, 19, está "contando os minutos para ir ao show". Segundo ele, os góticos não pertencem aos anos 80. "É para sempre, quando você assiste a filmes sobre o futuro descobre que ele é sombrio. Será um grande 'Blade Runner'."
Os fãs, não só da banda, mas também do estilo de vida acham que vão dividir o gramado do Pacaembu com gente que só conhece o lado mais pop do Cure.
"Sei que as pessoas vão lá só para ouvir a banda que toca 'In Between Days' e The Cure é muito mais", argumenta Sandra.
Essa tribo gótica dos anos 90 também dá seu recado para os góticos do século 21. "A cultura é muito importante", avisam.
"Tem que ler muito, autores como Baudelaire, Albert Camus, Augusto dos Anjos e Nietzche. Ver filmes do cinema expressionista alemão vampirismo em geral, também conhecer as bandas que surgem", recomendam.
O show da banda The Cure está previsto para começar às 23h.

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sobre o Hollywood Rock no caderno Acontece.

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