São Paulo, terça-feira, 23 de janeiro de 1996
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Elite domina 1º grupo de deputados palestinos

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A JERUSALÉM

A elite palestina será fortemente majoritária no Conselho de Autonomia, o Parlamento de 88 membros eleito sábado.
Esse dado é considerado mais relevante para o futuro das negociações entre Israel e os palestinos do que o fato, de resto previsível, de que a Fatah, o grupo comandado pelo presidente eleito, Iasser Arafat, fez uma maioria cômoda no Conselho (pelo menos 60%).
Já antes da eleição uma pesquisa feita por dois membros do escritório de informação palestino, Razi al Surani e Telal Okar, mostrara que 90% dos candidatos pertenciam ao estrato de mais alta renda.
É uma avaliação compartilhada pela inteligência militar israelense, conforme informe reproduzido pela Voz de Israel: "A família e considerações de ordem social superaram temas de organização e ideológicos na votação palestina".
A maior parte dos eleitos pertence ou aos quadros da ANP (Autoridade nacional Palestina) ou às elites acadêmicas, profissionais e empresariais. Se é assim, as negociações com Israel tendem a avançar mais facilmente.
Quem mais tem é quem mais teme perder em situações de impasse. Mais ainda no Estado palestino, cuja dependência de Israel é virtualmente total, a ponto de 35% de sua renda ser gerada pelos palestinos que trabalham em Israel.
O Hamas (Movimento de Resistência Islâmico), oposto ao processo de paz, acabou, na véspera do pleito, fornecendo uma lista de nove "candidatos aceitáveis", para orientar os eleitores que não quisessem boicotar a votação.
Dois intelectuais de peso que romperam com Arafat também estarão no Parlamento. São o médico Haidar Abdel-Shafi, considerado o único que poderia obter uma razoável votação se disputasse a Presidência com Arafat, e Hanan Ashraui, porta-voz da delegação palestina na primeira negociação com Israel (ocorrida em Madri, em 1991).
Outro grupo que tende a uma posição mais crítica é o dos "shabibas", os jovens líderes da intifada, a revolta contra Israel iniciada em 1987.
Durante todo o período eleitoral, foi áspera a disputa entre eles e o pessoal da Fatah que voltava do exílio e passou a ocupar a maior parte dos postos de poder.
Mas só mesmo após o Ramadã, o mês sagrado dos muçulmanos, iniciado domingo, é que haverá a primeira reunião do Parlamento e, por extensão, uma avaliação mais clara da correlação de forças políticas.
Enquanto isso, prossegue a discussão em torno do caráter democrático ou não que tomarão as instituições palestinas no futuro imediato.
Por mais que tenham chovido elogios sobre o processo eleitoral e cumprimentos a Arafat, as dúvidas persistem, principalmente em Israel.
Exemplo típico é o comentário de ontem do colunista Ronny Shaked, do mais popular jornal israelense, o "Yediot Ahronot": "Arafat não é mais o líder popular de uma organização, é um líder legítimo. Seu status mudou, mas é discutível se seu estilo quase absolutista de mandar também está próximo de mudar".
Para reforçar as suspeitas, o advogado Hussein Shiouki ficou 14 horas preso só por ter reclamado de fraude nas eleições em Hebron (35 km ao sul de Jerusalém).
A cidade ainda está em poder de Israel, é uma das mais tensas da região e registrou um índice relativamente baixo de comparecimento nas eleições gerais de sábado passado.
Há inúmeras outras queixas do gênero, principalmente porque não havia, até 21h de ontem (17h em Brasília) os resultados finais da votação para o Conselho.
Já para a Presidência, o resultado foi divulgado ainda no final de domingo e demonstrou uma vitória esmagadora de Arafat: 88,1%, contra menos de 10% de sua única adversária, a militante feminista Samiha Khalil.

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