São Paulo, quarta-feira, 24 de janeiro de 1996
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A cura do xixi

GILBERTO DIMENSTEIN

A Índia popularizou pelo mundo os mais exóticos tipos de tratamentos de saúde, baseados em alimentação vegetariana, massagem, meditação -amparados em pesquisas científicas, ganham cada vez mais apoio mas até então impenetráveis e conservadoras escolas de medicina dos Estados Unidos, a começar por Harvard.
Mas uma receita não vai pegar facilmente: beber a própria urina. Um entusiasta defensor da "urinoterapia", o primeiro-ministro Murarji Desai, morreu no ano passado com 99 anos, ostentando uma memória e lucidez que impressionava todos os jornalistas indianos.
Nos seus encontros com horrorizados chefes de Estado estrangeiros, ele gostava de divulgar detalhadamente a excelência de seu método -a urina, por conter as toxinas do corpo, exerceria o papel do veneno transformado em remédio, num princípio semelhante ao do antídoto contra picada de cobra ou ao da homeopatia.
Tamanho era seu entusiasmo que o primeiro-ministro deixou seguidores que lançaram o café da manhã mais exóticos do planeta.
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Se a "urinoterapia" tende a se restringir a um número reduzido de seguidores, a medicina alternativa, classificada como curandeirismo no Ocidente e, em especial, nos Estados Unidos, vai rompendo barreiras.
Impressionado com o resultado das pesquisas acadêmicas sobre a recuperação de ataques cardíacos, úlceras e depressão, o governo americano tirou as terapias alternativas do exílio.
Para desespero dos médicos tradicionais, ele patrocina estudos sobre os efeitos da música, acupuntura, massagem, ioga e meditação na recuperação de pacientes.
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De acordo com o pesquisador Herbert Benson, de Harvard, o entusiasmo não se deve apenas pelas pesquisas científicas que mostram uma inegável relação entre técnicas de relaxamento com a melhora dos pacientes -para dar efeito, o tratamento deve, segundo ele, ser complementar.
O entusiasmo é mesmo pelo custo: gasta-se muito menos dinheiro com a medicina alternativa.
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Harvard está empanturrada de consultas de seguros de saúde sobre se deveriam pagar esses tratamentos. As seguradoras também adoram a idéia; afinal, pagam menos.
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Próximo em paladar ao método do primeiro-ministro indiano só me lembro da técnica também orgulhosamente divulgada pelo prefeito de São Paulo, Paulo Maluf. Ele faz adormecer alho num copo com água, sorvida de manhã.
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Com apenas um número, a Índia mostra como o Brasil errou ao tratar o campo, permitindo que famílias, desesperadas, fossem mendigar nas cidades. Eles têm 50 milhões de hectares de terras irrigadas; temos pouco mais de um milhão.
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A veneração às vacas sempre provocou estranheza no Ocidente, por causa do contraste entre desnutrição e abundância de carne. Acontece que, devido a essa abundância, hoje a produção de leite é gigantesca e serve para baratear o preço do leite e do queijo, ajudando nas campanhas governamentais contra desnutrição.
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Recebi aqui reportagem que deveria ser memorizada por todos os brasileiros. Segundo Carlos Alberto Sardenberg, da Folha , com a queda da inflação, o poder de consumo do brasileiro, ou seja, dinheiro no bolso, cresceu R$ 26,4 bilhões.
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Se os brasileiros nunca esquecerem que a inflação é a grande roubalheira nacional, tão cedo os preços não voltam a subir.

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