São Paulo, quarta-feira, 24 de janeiro de 1996
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Pela manutenção da independência

JOSÉ EMMANUEL BURLE FILHO

O Ministério Público é essencialmente democrático. A eleição do procurador-geral de Justiça é a de maior abrangência por envolver os 1.500 promotores e procuradores de Justiça. Os mais votados compõem, por lei, uma lista tríplice. O governador do Estado tem nomeado, desde o governo Montoro, o primeiro colocado, o eleito pela classe.
Isso ocorre em respeito aos princípios democráticos, para que o MP seja independente e para que não haja suspeita sobre a conduta do procurador-geral.
Como se trata de lista tríplice, a lei permite que cada promotor vote em um, dois ou até três candidatos, circunstância que pode levar alguém a tentar mascarar o resultado da eleição, utilizando-se do expediente de somar votos dos dois últimos colocados para confrontá-los com os do primeiro. O certo é que o primeiro colocado na apuração é o que detém os votos do maior número de integrantes da carreira: é o eleito pelos promotores e procuradores de Justiça.
O MP de São Paulo é exemplo de Ministério Público. Devo lembrar ao leitor e, em última análise, à sociedade, que o MP presta relevante serviço à comunidade, ao cidadão e à nação, exercendo, nas grandes, médias e pequenas comarcas do Estado, as inúmeras e difíceis funções que a Constituição Federal, com sabedoria, lhe outorgou.
Pela Carta de 88, o MP é o titular exclusivo da ação penal pública e, por meio do inquérito civil e da ação civil pública, tem o poder/dever de defender o regime democrático e a ordem jurídica, bem como o patrimônio público, os menores, a cidadania, o meio ambiente, o consumidor e outros interesses difusos e coletivos. Por isso o MP é o defensor constitucional da sociedade e não do governo. Daí a necessidade inarredável de ser garantida a sua independência frente aos poderes.
Sem embargo dos avanços obtidos nos últimos anos, o Ministério Público ainda não dispõe de um número suficiente de técnicos para atender aos promotores de Justiça na devida e necessária instrução do inquérito policial e/ou civil, nos casos mais relevantes. Esse aspecto obsta ou dificulta a devida apuração dos fatos, tornando-a morosa. É preciso, pois, continuar o trabalho para dotar o MP de atividade-meio mais eficiente. Na Procuradoria Geral vou continuar dando prioridade a esses aspectos e àquelas funções constitucionais.
Na área funcional, manterei a prioridade do combate ao crime organizado, ampliando a atuação do Grupo de Promotores criado pioneiramente para esse fim. A recente lei dos juizados especiais criminais será prioritária, ciente de que é vital para a sociedade e para o interesse público. Afinal, possibilita a tão esperada agilização da área criminal e permite aos membros do MP maior disponibilidade para crimes de reconhecida relevância, o que certamente redundará em respostas eficientes à criminalidade, atendendo aos anseios da sociedade.
Igual tratamento terá o combate ao crime de sonegação fiscal, já que sua nefasta existência impede o Poder Público de dispor de recursos suficientes para a saúde pública, educação, segurança e saneamento básico, serviços públicos que são essenciais, especialmente para as camadas mais necessitadas.
Continuarei estimulando os promotores de Justiça para as questões de interesse para a cidadania e com indiscutíveis reflexos sociais: evitar sempre que possível a evasão escolar; zelar para que o registro da carteira de trabalho seja feito regularmente; trabalhar permanentemente para minorar a problemática do menor, inclusive para a questão dos menores de rua, entre outros.
Como exemplo cito a pioneira ação civil pública sobre os menores de rua da capital, elaborada por quatro excelentes promotores, na qual, em razão de acordo já homologado, o município assumiu o compromisso de dar tratamento adequado aos menores, afastando-os das ruas. Sendo a moralidade administrativa a alavanca para o desenvolvimento social, manterei a especial atenção dada à defesa do patrimônio público nestes dois anos. Como procurador-geral ajuizei ações civis públicas contra mais de 70 réus (ex-governadores, secretários e diretores de estatais), buscando ressarcir aos cofres públicos mais de R$ 200 milhões.
Esses fatos demonstram a importância da independência do MP para a eficiência de sua atuação. A propósito disso e à vista de insinuações maldosas feitas pelo meu adversário, quero deixar claro que jamais tive qualquer atuação partidária ou vinculação política com quaisquer governos ou governadores, passados ou atuais, notadamente no exercício da Procuradoria Geral, traço que tem marcado minha atuação funcional, pois nunca me afastei da carreira ou de minhas funções processuais para participar de órgãos do Executivo.
Penso que é fundamental a manutenção da independência do Ministério Público, o que continuarei fazendo no meu segundo mandato, pois a intransigente defesa da independência da instituição sempre foi minha postura.
À luz dessas considerações, a sociedade deve pedir e encarecer aos seus representantes -os legisladores- redobrada atenção para com o MP, máxime na revisão constitucional. Se a instituição for independente e autônoma, dotada de garantias, estrutura técnico-administrativa e funções constitucionais, estarão fortalecidos o regime democrático, a defesa da ordem jurídica e a tutela dos interesses sociais e do cidadão.
E o MP tem exercido as suas funções constitucionais com independência, autonomia e igualdade, levando ao Judiciário as postulações atinentes à defesa do patrimônio público, da moralidade administrativa e de outros interesses sociais e difusos, sem se importar com o colorido político-partidário de quem esteja no poder e do destinatário da sua atuação.
No novo mandato seguirei as premissas que balizaram o MP nos últimos dois anos: independência, profissionalização, ética, racionalização, descentralização e fixação de responsabilidades.

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