São Paulo, sábado, 27 de janeiro de 1996
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Na rota das Índias

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO - O Brasil, desde a sua fundação, tem alguma coisa a ver com a Índia, além do saudável acordo nuclear que FHC acaba de firmar por lá, não se sabe bem por que nem para quê. Os compêndios escolares ensinam que Cabral queria ir para as Índias (era plural naquele tempo), acabou dando com caravelas e costados na Bahia: como os criminosos no ato do crime, fomos descobertos.
Navegante do final do século 20, o presidente da República corre o risco de, sem querer e saber, ao sabor das calmarias da política interna (para ele o governo é que nem aquele soneto do poeta: um manso lago azul), dar com sua numerosa comitiva numa terra até agora desconhecida. Brasília, por exemplo.
Do Brasil como país a ser governado por alguém FHC ainda não tomou conhecimento. Diariamente, ele próprio e seus assessores mais íntimos procuram saber nas folhas quem será o candidato em 1998 -essa é toda a estratégia, toda a mecânica do atual governo: ficar como primeira ou segunda alternativa da próxima sucessão.
Estamos iniciando o segundo ano do mandato de FHC. E ainda não está claro se o próximo candidato será Sarney ou Luís Eduardo, Covas ou Serra, ACM ou Maciel -e enquanto não ficar estabelecido qual será o novo centro do sistema solar, FHC preferirá comer pelas beiras, oferecendo-se como segunda alternativa. Para o grupo que se instalou em Brasília o importante é ficar onde está.
Faço votos para que os ventos alísios (nunca usei essa expressão, nem sei exatamente o que sejam esses ventos alísios, mas vai lá) empurrem as caravelas de FHC de novo para a Bahia e ele descubra um país que precisa de saúde, educação, segurança etc, etc.
Em vez de se preocupar com a nossa bomba nuclear (que ainda não existe) e com as Olimpíadas de Barcelona (que já existiram), tome conhecimento de um cidadão que de mão espalmada, como num juramento, durante a campanha eleitoral prometeu saúde, educação, segurança etc, etc. E, repetindo Cabral que se perdeu na rota das Índias, tome posse da terra.

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