São Paulo, domingo, 28 de janeiro de 1996
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Jari investe para se tornar realidade

EDUARDO BELO
ENVIADO ESPECIAL A MONTE DOURADO

A Jari Celulose escolheu 1996 como o ano da virada. A empresa está desenvolvendo uma série de ações para transformar o que começou como uma aventura na selva em um negócio rentável.
O investimento na fábrica localizada à margem do rio Jari, na divisa do Pará com o Amapá, é de US$ 133 milhões em quatro anos.
"Queremos sair do vermelho", declara Fernando Tigre, 52, há um ano na presidência da empresa.
Desde que foi implantada, em 1967, a Jari só registrou lucro uma vez, em 1994. O balanço de 1995, ainda não-concluído, deve apresentar algum equilíbrio -mas a empresa, de capital aberto, não divulga nem mesmo estimativas de resultado. Até setembro, o prejuízo acumulado era de R$ 6,3 milhões.
A série de investimentos tem por objetivo reduzir os custos até 1998, aumentar a atual produção de 268 mil para 350 mil toneladas por ano e tornar real a principal vantagem competitiva da companhia: a proximidade da matéria-prima. A distância média entre floresta e fábrica na Jari, 45 quilômetros, é a menor do mundo.
Faz parte do programa a redução da mão-de-obra, com mecanização cada vez mais acentuada da colheita. Para isso, são usados "tratores" equipados com ar-condicionado, operados por uma só pessoa, capazes de agarrar uma árvore, eliminar os galhos e cortá-la rente ao chão.
Neste ano, a Jari vai investir US$ 33 milhões para equipar a fábrica com um sistema de branqueamento da celulose com uso de oxigênio -em vez de cloro.
O processo será concluído em 98. Hoje, segunda a empresa, metade da produção já não usa cloro.
Menos poluente, o novo sistema é praticamente exigência dos principais clientes no exterior -para onde seguem 70% da produção-, cada vez mais ecológicos.
Outros US$ 70 milhões serão injetados no ano que vem. Além do processo de branqueamento, o dinheiro se destina a uma série de adaptações para compensar a idade da fábrica, instalada em 1978, e torná-la mais produtiva, afirma o diretor industrial, Erton Sanchez.
O passo seguinte é operar só com madeira própria. Isso deve acontecer também em 98, quando começa a colheita da primeira leva de eucaliptos geneticamente melhorados pela empresa.
As árvores terão de cinco a seis anos de idade e um rendimento bem superior ao das atuais, informa Lineu Wadousky, diretor florestal.
Os vários erros cometidos desde o nascimento da companhia (leia texto ao lado) fizeram com que, até o momento a empresa tivesse uma produtividade muito baixa.
Enquanto as melhores indústrias do setor que operam com eucalipto conseguem perto de 40 m3 de madeira por hectare/ano, a Jari ainda não ultrapassou 29 m3 em plantios comerciais -embora algumas áreas experimentais projetem até 65 m3 para o futuro.
A nova produtividade tende a compensar os 25% de madeira comprados hoje na Bahia. Essa "importação" encarece em até US$ 58 por tonelada a celulose da Jari, diz Fernando Tigre.
A empresa tem esperança de que a modernização da fábrica e o maior rendimento da madeira proporcionem uma redução de custo capaz de colocá-la em definitivo no azul a partir de 98.
"Com o custo de produção bastante reduzido, podemos ser competitivos até com preços mais baixos para a celulose", diz Tigre.
Apesar de ter caído no final de 1995, a cotação atual de US$ 810 por tonelada de celulose é 25% superior à média histórica do setor, diz Britaldo Pedrosa Soares, 39, diretor financeiro.
Mesmo assim, a Jari trabalha com a perspectiva de novo aumento no próximo trimestre. Os preços internacionais começaram a subir há dois anos e isso foi em parte responsável pelo lucro de US$ 6,5 milhões em 1994.
Também contribuíram para o resultado o Plano Real e a defasagem cambial. A empresa carregava forte endividamento em dólar. Com o dólar barato, a Jari abriu o capital em 1994, captou US$ 100 milhões no mercado e solucionou o problema da dívida, reduzindo os custos financeiros que contribuíam para aumentar o tamanho do prejuízo.
O investimento seguinte será a construção de uma usina hidrelétrica no rio Jari, que deve sanar em definitivo os problemas de energia da região e ainda resultar em economia. Hoje, a energia vem de uma termoelétrica alimentada a óleo combustível.
O projeto está definido e deve custar US$ 70 milhões na primeira fase (33,3 gigawatts/hora, com 10% cedidos à cidade de Laranjal do Jari). Como a construção é modular, a usina poderá, no futuro, gerar até 100 GWh.
A Cadam (Caulim da Amazônia), empresa do grupo Caemi, controlador da Jari, responderá por 30% do gasto com a hidrelétrica. As obras começam neste trimestre.
Tigre também quer reduzir as "despesas sociais". A empresa quer repassar para o Estado parte da infra-estrutura que montou em 29 anos e se desfazer de gastos anuais de US$ 4 milhões com saúde e US$ 1 milhão com educação.
Três das quatro escolas de Monte Dourado já funcionam em convênio com o governo do Pará. A empresa mantém a infra-estrutura e o Estado paga os professores.

Os jornalistas EDUARDO BELO e EVELSON DE FREITAS viajaram a convite da Jari Celulose S/A.

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