São Paulo, domingo, 28 de janeiro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O goleiro e o pênalti

JUCA KFOURI

Um dia a rainha Hortência aprendeu que o lance livre é como um presente que a regra do basquete dá a quem sofre uma falta.
Por isso, antes de arremessá-lo, ela fecha os olhos, agradece a dádiva, respira e chuta para a cesta. "Jogar fora um presente é falta de educação", ensina.
Já o pênalti é um castigo que a regra do futebol reserva aos goleiros. Defendê-lo é uma ciência que poucos dominam.
O rei Pelé, por exemplo, conta que só o goleiro Cláudio, tricampeão paulista pelo Santos em 1967/68/69, ganhava dele nas apostas que faziam durante os treinamentos.
Cláudio esperava Pelé levantar a cabeça na hora de bater e não se mexia, diferentemente do que faziam todos os outros.
Então, em vez de Pelé chutar no lado oposto ao que o adversário ia, era ele quem tinha que escolher o canto, e Cláudio, com frequência, pegava.
Essa lição o pai tenta passar para Edinho, que, na opinião suspeita de Pelé, se tornará "o maior pegador de penais do país".
Pelé chega a dizer para Edinho que, se ele não aparecer na foto de um pênalti, é melhor o goleiro nem procurá-lo. Ele não vai querer conversa.
"Nunca tente adivinhar o canto, concentre-se para ir na direção da bola", Pelé dá a receita. E Edinho anda mesmo pegando pênaltis.
Edinho pega pênalti, e Ronaldo, do Corinthians, sofre penalidades mesmo quando não as provoca, sem saber por quê. Saberá, um pouco, agora.
Durante o jogo entre Corinthians e Internacional-RS no Campeonato Brasileiro passado, um torcedor aproximou-se de um pequeno grupo nas numeradas do estádio do Pacaembu.
Percebeu que um senhor, de cabelos grisalhos, usava o jogo para dar aula a um grupo de jovens aspirantes a árbitros.
No começo do segundo tempo, 1 a 0 para o Corinthians, o instrutor vira-se para o grupo e anuncia: "Não dou dez minutos para o Ronaldo começar a aprontar. Vocês vão ver como ele consegue irritar o juiz".
O torcedor não se conteve e reclamou, dizendo que aquilo era prevenção e que o goleiro iria ficar marcado pelos jovens aspirantes.
O homem grisalho mandou chamar um segurança, apontou para ele e passou a fazer ameaças. O torcedor, é claro, achou melhor se afastar.
Para Ronaldo, o lance não é livre, e o pênalti já está marcado. Será que José Astolfhi, grisalho e instrutor de árbitros, sabe disso?

Texto Anterior: Notas
Próximo Texto: Candinho luta para conter clima de euforia no Santos
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.