São Paulo, domingo, 28 de janeiro de 1996
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O PT e a Previdência

JOSÉ DIRCEU

Em agosto de 95, o PT apresentou uma proposta para a reforma da Previdência e um método democrático para sua discussão. Pretendíamos envolver toda a sociedade, principalmente os aposentados e trabalhadores, os empresários e o Congresso. Entendemos que, de acordo com a concepção que vier a prevalecer nessa reforma, poderemos ter uma sociedade mais justa e democrática ou vamos atender somente a interesses dos bancos, seguradoras -das mesmas minorias privilegiadas de sempre.
O PT defende em sua proposta, e preserva na Constituição, o conceito de seguridade social, abrangendo a previdência, a assistência social e a saúde de forma integrada e com orçamento próprio. Para o PT, a seguridade social não deve se apoiar apenas no seguro social com base na contribuição, mas garantir um regime básico universal e ter um orçamento próprio que, além da arrecadação contributiva, receberá recursos tributários do orçamento da União.
Entendemos que o critério social para definir o direito à Previdência tem de ser o trabalho, a produção social, e não apenas ou exclusivamente, como quer o governo, a contribuição.
Na atual situação é preciso uma rede de proteção social que reverta a tendência de exclusão, desigualdade social e miséria de nossa sociedade capitalista. A aposentadoria por tempo de trabalho visa principalmente proteger o trabalhador de baixa renda, sem carteira de trabalho, que não recolhe contribuição, mas trabalha e produz a riqueza do país. Do contrário a exclusão e a desigualdade vão continuar se aprofundando.
O PT também propôs uma gestão pública quadripartite na previdência pública (Estado, trabalhadores, empresários e aposentados) e um regime básico universal, com piso de benefícios de um e teto de dez salários mínimos para todos os trabalhadores. Acima de dez salários, propomos a previdência complementar pública, privada ou na forma de fundos de pensão fechados.
Em nenhum momento o PT defendeu privilégios ou distorções. Ao contrário, propõe, entre outros pontos, a extinção da aposentadoria especial de parlamentares, veda a acumulação de aposentadorias, impõe regras para impedir a contagem em dobro do tempo de serviço no caso dos servidores públicos e, no caso da magistratura, extingue o privilégio da aposentadoria após cinco anos de exercício no cargo.
Defendemos a aposentadoria especial da mulher, do trabalhador rural, dos professores, de atividades penosas e insalubres. Direitos e não privilégios.
A proposta governista visava a privatização da Previdência e, a curto prazo, objetivava reduzir os gastos com a Previdência, sem nenhuma proposta de combate à corrupção e à sonegação.
O governo propunha uma previdência estatal, não pública, sem gestão quadripartite, com teto de até três salários mínimos, com base no critério de 40 anos de contribuição e 60 anos de idade, igual para o homem e para a mulher, para o trabalhador urbano e o rural. Remetia a maioria dos atuais direitos para a legislação complementar ou simplesmente os extinguia.
Ao não permitir nem sequer a constituição de uma previdência complementar pública o governo revelava e não escondia seus objetivos de caminhar para a privatização da Previdência, criando na prática um sistema com teto de três salários mínimos com base na contribuição auto-sustentado. O objetivo era retirar o Estado da obrigação de prestar o seguro social no Brasil.
O governo tinha a clara intenção de retirar os trabalhadores rurais dos benefícios previdenciários, transferindo-os para a assistência social, e extinguia a aposentadoria por tempo de serviço, a proporcional, a especial dos professores, e pretendia tomar como base as 120 últimas contribuições para o cálculo do valor dos benefícios da aposentadoria.
O governo também não propunha nada sobre o setor informal, a recuperação do poder aquisitivo dos atuais benefícios e o desvio dos recursos de seguridade social para outros fins pelo Ministério da Fazenda. Exatamente o contrário de tudo que o PT defende.
O governo FHC, na marcha das reformas econômicas, esperava aprovar no Congresso, e a toque de caixa, uma reforma que além de desconstitucionalizar a Previdência não propunha uma transição do atual sistema para o novo.
Sua proposta era tão selvagem que foi rechaçada, inclusive em sua base parlamentar e nos debates na Comissão Especial. Sob pressão popular e, no fim do ano, com a presença dos sindicatos e aposentados na Câmara, o relator Euler Ribeiro aceitou vários pontos apresentados pela oposição e pelas centrais, como o teto de dez salários mínimos e a aposentadoria do trabalhador rural.
Derrotado no seu intento de aprovar seu projeto de Previdência e sem condições de fazer funcionar a Comissão Especial na Câmara, o governo resolveu abrir negociações com as centrais sindicais que deram como resultado o Protocolo Conjunto entre o governo, o relator e as centrais, anunciado dia 18.
Produziu-se então uma celeuma na imprensa, a partir da notícia divulgada pelo Planalto que dava como firmado um acordo entre as centrais e o governo -que hoje, já se sabe, não aconteceu.
Em meio a isso, é preciso separar as diferenças reais que podem existir entre o PT e a Central Única dos Trabalhadores das informações infundadas, inverídicas. O PT reconhece e apóia o direito da CUT de negociar com o governo, resultado da autonomia e independência sindical que conquistamos no Brasil e pela qual o PT sempre lutou e sempre praticou na sua relação com a Central.
O importante é a atuação conjunta da CUT com as oposições no Congresso, na sociedade e a unidade das centrais sindicais e da Confederação Brasileira dos Aposentados para derrotar a proposta do governo. A nota da CUT, divulgada dia 23 de janeiro, é clara. Não houve acordo, o resultado das negociações até agora apresenta pontos positivos e negativos. É necessário continuar a negociação e a mobilização.
É preciso ser transparente e honesto com a sociedade. O PT e sua bancada na Câmara têm o direito e o dever de expor abertamente seu ponto de vista, como por exemplo na defesa da aposentadoria por tempo de trabalho, da mesma forma que as centrais têm o direito de negociar com o governo. Isso é democracia e é disso que o Brasil precisa e o governo necessita praticar.

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