São Paulo, segunda-feira, 29 de janeiro de 1996
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ONG americana acusa polícia do Rio

EMANUEL NERI
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

A Polícia do Rio de Janeiro é corrupta e violenta, não consegue deter a criminalidade no Estado e há uma "indiferença aterradora" das autoridades brasileiras para os excessos policiais e violações de direitos humanos.
Esse diagnóstico consta do relatório sobre violência no Rio, elaborado pela Human Rights Watch/Americas, que será divulgado simultaneamente às 14h de hoje no Brasil e em Washington (EUA). A Folha obteve esse texto com exclusividade.
Trata-se da mais contundente conclusão já feita sobre o Rio por uma entidade internacional de direitos humanos. A Human Rights é a maior ONG (organização não-governamental) de direitos humanos do continente americano.
Com 72 páginas, o texto refere-se a uma "cidade sitiada" e em "estado de guerra". Diz que os homicídios no Rio triplicaram nos últimos 15 anos, passando de 2.860 casos em 1980 para 8.408 em 1994. O relatório será enviado ao governo brasileiro e a entidades internacionais de direitos humanos.
Em seu relatório, a Human Rights relata inúmeros casos de brutalidade policial, incluindo dois massacres -ambos na favela Nova Brasília, zona norte do Rio -, na qual morreram 27 pessoas. Para a entidade, houve execuções sumárias -as pessoas foram mortas com tiros na cabeça.
Faz um duro relato da "Operação Rio", ocupação de favelas pelo Exército e forças policiais entre novembro de 1994 e junho de 1995. Para a entidade, a operação foi marcada por "torturas e prisões arbitrárias".
O relatório diz que, na "Operação Rio", o Exército foi "mobilizado" para ajudar na luta contra o tráfico de drogas "precisamente por causa da violência e corrupção notórias da polícia fluminense".
"Infelizmente, a operação não incluiu medidas, nem por parte do Estado, nem das autoridades federais, para combater as violações dos direitos humanos", diz. Faz sugestões ao governo brasileiro.
"Se o governo federal quer contribuir significativamente para a luta contra o crime no Rio, sua atenção deve se dirigir também para a violência fardada", diz, referindo-se à Operação Rio. "Deve também assegurar que os militares não se utilizem de métodos abusivos proibidos pelos tratados internacionais de direitos humanos ratificados pelo Brasil", afirma.
Para a Human Rights, a convicção de que a violência no Rio está "fora de controle" e de que a cidade está "infestada de criminosos" acabou alimentando uma "política pública irresponsável, que tolera a violência oficial".
"O tráfico de drogas e a violência que o acompanham se tornaram, sem dúvida, uma ameaça crescente para os cidadãos do Rio", afirma. "Mas operações de combate às drogas que não respeitem os direitos humanos subvertem o Estado de Direito."
O relatório condena declarações de autoridades, como a do governador do Rio, Marcello Alencar (PSDB), que vê excessos da polícia como "episódio isolado". Para a ONG, isso "encoraja" a violência policial.
A Human Rights lembra declaração de Alencar sobre o assassinato de um assaltante por um policial, em um shopping center da zona sul do Rio, diante das câmeras de TV. Para ele, o crime tinha que ser visto como "situação limite que define o combate duro e direto" entre policiais e criminosos.
Segundo o relatório, trata-se de uma "uma declaração espantosa", capaz de estimular a polícia do Rio a praticar cerca de 200 assassinatos apenas nos seis primeiros meses do ano passado.

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