São Paulo, segunda-feira, 29 de janeiro de 1996
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Juro elevado acelera entrada de dólares

JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Este mês, as entradas de dólar superaram as saídas em US$ 2,5 bilhões no câmbio comercial (exportações e importações). Descontadas as saídas realizadas pelo dólar flutuante (segmento do dólar turismo), da ordem de US$ 700 milhões, o ingresso líquido já soma US$ 1,8 bilhão.
Se esse ritmo for mantido ao longo do ano, só por conta disso, a dívida interna em poder do público cresceria 27%. Ou seja, o BC compra os dólares, emite reais. Depois, para "enxugar" esses reais, o BC vende títulos.
Gustavo Franco, diretor de Assuntos Internacionais do BC (Banco Central), admitiu, na sexta-feira, que "poderá desenvolver" novos instrumentos tributários (impostos) para desestimular a entrada de dólares, além do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras).
A proposta de Franco é um erro, avalia Joaquim Elói Cirne de Toledo, da Nossa Caixa-Nosso Banco. "Seria o mesmo que continuar apertando o acelerador e colocar um guincho para puxar o carro para trás". Para ele, não há dúvida: o juro alto é o pé no acelerador. "Quer reduzir o ingresso? Baixa os juros e pronto".
Segundo o economista, a função do juro não é segurar a inflação ou o consumo. "O juro é eficiente para controlar o fluxo de capitais".
Embora ponderando que a queda tem de ser feita mesmo na base da tentativa e erro (que ele chama de a "prova do pudim"), Cirne de Toledo acredita que um juro de 13% ao ano mais variação cambial "já seria bem razoável".
O governo promete, em dólar, taxas maiores, ao redor de 18%. Mas essa meta ainda depende da concretização da queda dos juros para a metade do que foi o ano passado, conforme declarou o ministro Pedro Malan (Fazenda).
Por ironia, tanto o juro alto como a expectativa de queda futura servem para acelerar a entrada de dólares. "A certeza de que os juros vão cair faz com que o dólar entre antes; ganha mais quem entra mais cedo", diz Cândido Bracher, do BBA Creditanstalt.
O BBA fez uma emissão no exterior e está trazendo 150 milhões de marcos alemães. "É para atender a demanda de crédito de longo prazo", afirma.
Outra instituição que se prepara para emitir Bonds no exterior com o mesmo objetivo é o Banco de Boston. "Vamos captar US$ 120 milhões no início de fevereiro", diz Sérgio Gabrielli.
Não se trata de um privilégio privado. Ao contrário. O Tesouro articula outro "Samurai" (título emitido no mercado japonês); o BNDES já anunciou a intenção de buscar US$ 300 milhões e a Petrobrás, outros US$ 500 milhões.
No fundo, é uma troca de dívida. A dívida em dólar paga juros menos salgados que a em reais (entre 14% a 19% ao ano contra, na melhor das hipóteses, 31%), e o prazo é mais longo (dois anos contra o máximo de um).
Logo, parcela substancial do ingresso de capitais se traduz em aumento da dívida externa brasileira.
Capital especulativo
"Outro pedaço é investimento produtivo mesmo" diz Gabrielli, que considera o cenário internacional favorável. "Está sobrando dinheiro no mundo e os juros caíram na Europa e nos EUA".
Gabrielli diz que a qualidade do dólar que está entrando é mais sadia (no sentido de ser menos especulativo), embora existam operações de arbitragem de juros (o investidor ganha a diferença do juro brasileiro contra o internacional).
Na sexta, o diretor do BC Gustavo Franco comemorou uma vitória contra o capital especulativo, imposta, segundo ele, com o IOF de 7% e uma "blitz telefônica", que emagreceu as operações realizadas via contas de não-residentes (as chamadas CC5).
Mas, segundo a Folha apurou, grande parte das operações acertadas via CC5, especialmente de troca de dívidas, está sendo remontada no comercial (com entrada permitida e comemorada pelo BC). O mesmo dinheiro sai pelo flutuante, mas volta pelo comercial.
Detalhe: os recursos captados no exterior que ficam no caixa dos bancos ou de empresas acabam, como antes da vitória contra a especulação, procurando o refúgio dos títulos e dos juros do governo.

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