São Paulo, segunda-feira, 29 de janeiro de 1996
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O orçamento das universidades federais

ANTÔNIO DIOMÁRIO DE QUEIROZ

Não há desvio de recursos orçamentários pelas universidades federais. Os gastos em 1995 foram rigorosamente de acordo com as autorizações ministeriais, nos limites da lei orçamentária e dos créditos suplementares aprovados pelo Congresso Nacional.
As universidades não podem ir além desses limites nem transformar verba de pessoal em custeio, procedimento que o sistema de acompanhamento financeiro (Siafi), no qual estão integradas, não permite.
Como então explicar a fantasiosa revelação de que as universidades federais gastaram irregularmente R$ 500 milhões em 1995?
Há três razões para tamanho desentendimento: a desorganização do orçamento público, a penúria orçamentária das universidades públicas e o propósito político de intimidar aqueles que se contrapõem ao desrespeito às leis e alertam contra as consequências danosas da ação governamental, que desconsidera os efeitos sociais do descaso com a educação e a saúde.
As dificuldades para a execução orçamentária começam com a não-aprovação do Orçamento da União até o dia 31 de dezembro pelo Congresso Nacional. Em consequência, desde janeiro instaura-se a anormalidade orçamentária, que permanece até dezembro, pois os créditos suplementares, em geral, só ocorrem nas últimas semanas do ano. É o que se repete em 1996.
Fevereiro se inicia sem a aprovação do Orçamento pelo Congresso Nacional. Assim, as universidades submetem-se ao duodécimo da proposta orçamentária do Executivo, completamente irrealista, muito aquém das necessidades. Por exemplo, na Universidade Federal de Santa Catarina, para as despesas mensais com água, luz, telefone, informática, vigilância, limpeza, hospital universitário e outros serviços, foram autorizados apenas 60% do seu valor.
Que contas deixar de pagar? É o mesmo que acontece com as 52 instituições federais de ensino superior (Ifes). Para resolver o problema ou se conseguem antecipar recursos financeiros no primeiro semestre, aguardando as suplementações do final de ano, ou se aprovam já as suplementações propostas pela Andifes, ou se fecham as universidades e seus hospitais universitários.
O mesmo fenômeno ocorreu em 1995. As antecipações de recursos pelo Ministério da Educação viabilizaram somente o minimamente necessário para o funcionamento das Ifes, que não foram sequer contempladas com recursos para investimento em programas acadêmicos, acervo bibliográfico, laboratórios, recuperação ou construção de obras de infra-estrutura. Ao final do exercício, com as suplementações, restabeleceu-se o equilíbrio orçamentário.
Mesmo assim, o ministro alegou falta de disponibilidade de caixa para pagar os precatórios determinados pela Justiça, a totalidade dos encargos sociais da folha de dezembro e o crédito educativo do segundo semestre destinado aos estudantes das universidades particulares.
O descomprometimento do governo com o orçamento de investimento das universidades públicas ignora determinação constitucional de estender as unidades de ensino superior às cidades de maior densidade populacional nos Estados. No ano passado foi quase nulo, e é de somente de R$ 60 milhões na proposta governamental de 1996.
Essa anomalia tem levado ao sucateamento da universidade pública. A proposta da Andifes de suplementação de R$ 150 milhões foi rejeitada. A comunidade acadêmica não consegue compreender como são viabilizados tantos bilhões de reais para socorrer a área bancária e não se priorizam os poucos milhões necessários para as universidades, prejudicando o conjunto do país.
Alegam os adversários da educação pública superior que as Ifes recebem montante muito alto de recursos, em detrimento do ensino fundamental. Mas, se o ministro da Educação tem reiterado que existem recursos públicos da ordem de R$ 25 bilhões por ano para a educação e as universidades federais custam de R$ 5 bilhões a R$ 6 bilhões, onde estão sendo aplicados os outros R$ 20 bilhões?
Necessário é garantir que a totalidade desses recursos não se desvie da educação como um todo.
Questionam-se também das despesas de pessoal das Ifes. Seu aumento é na sua totalidade decorrente das aposentadorias, que estão sendo incentivadas pelo próprio governo, via Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado (Mare). Porém, desde 1985, o quadro de professores e servidores técnico-administrativos das universidades públicas está estabilizado, e as contratações recentemente autorizadas só substituem 50% das aposentadorias, com graves consequências sobre o futuro.
Como a folha de pessoal representa cerca de 90% do orçamento das universidades públicas, dada a excessiva compressão das despesas de manutenção e investimentos, compreende-se o esforço de centralização de toda a administração pública no Sistema Integrado de Administração de Pessoal (Siape).
A maioria das universidades públicas integrava o sistema há muito tempo. As demais passaram a integrá-lo em outubro do ano passado.
É inverídica a afirmação de que as irregularidades da folha de pessoal das universidades passaram a ser corrigidas por essa centralização. Gratificações consideradas indevidas pelo Mare estão amparadas por legislação em vigor e decisões judiciais. Seu corte intempestivo tem provado ações trabalhistas que resultarão certamente em custos maiores que os valores economizados.
Se algumas leis são absurdas, devem então ser revogadas, mas, enquanto em vigor, sua obediência não pode subordinar-se à vontade dos governantes.
Por informar ao Senado Federal e aos juízes sobre o descumprimento do pagamento dos direitos trabalhistas (precatórios) e preparar mandado de segurança ao Supremo Tribunal Federal, contrapondo-se à ilegalidade do decreto 1.762, não estranha a Andifes que fontes governamentais contrariadas com essa atitude democrática, em represália, alimentem a imprensa com notícias falaciosas, denegrindo os dirigentes universitários.
Se irregularidades existem nas universidades federais, estão sendo continuamente apuradas com rigor pelos órgãos de auditoria, corrigidas e definidos os responsáveis.

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