São Paulo, quarta-feira, 2 de outubro de 1996
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E se o diretor da escola de seu filho fosse gay?

BARBARA GANCIA
COLUNISTA DA FOLHA

Semana passada, quando surgiu a notícia de que o coronel do Exército Sérgio Carlos Zani Maia, 46, havia sido pego com a boca na botija com um rapaz dentro de seu carro e que, consequentemente, sua vida profissional tinha ido para o beleléu, pensei em uma conhecida, decoradora, que me ligou para pedir referências de uma escola onde estudei.
"Gostaria de colocar minha filha lá, pois sei que a qualidade do ensino é excelente", me contou. "Mas ouvi dizer que o diretor é gay. O que você me diz?" Disse o mínimo possível e desliguei o telefone.
Não discuto que o Exército seja um lugar onde o ímpeto sexual deva ser reprimido. O salitre, adicionado à comida dos soldados, está aí que não me deixa mentir. Como se sabe, nos EUA, a despeito das promessas eleitorais de Clinton e do maciço lobby perpetrado pelos gays, os homossexuais que têm a preferência sexual revelada continuam a ser chutados para fora das Forças Armadas -sem direito à compensação financeira.
Tampouco discuto que uma mãe queira o melhor para sua filha e se interesse em saber que tipo de pessoa está ajudando a moldar o caráter da guria.
O que causa espanto é constatar que a minoria gay obteve nas últimas décadas conquistas bem menos expressivas do que outras ditas minorias, como negros e mulheres.
Considerando que os gays são os maiores militantes contra a praga da explosão demográfica; que historicamente atuam em áreas como a cultura e as artes; que são defensores ferrenhos da estética e, finalmente, que somam um grupo com poder aquisitivo dos mais elevados, muito me admira que ainda exista tanto tabu em torno da questão.
Pessoalmente, talvez por ter sido educada à européia, pouco me interessa se uma pessoa gosta de comer chuchu ou beringela. Conhecer as preferências íntimas das pessoas para mim é detalhe. Se é ou não homossexual; se prefere ser amarrado no pé da cama; se gosta de se atirar de cima do guarda-roupa, pouco importa.
Pena que nem o Exército, nem minha amiga decoradora pensem assim. E julguem profissionais excelentes, como o coronel Maia, que obteve todas as suas promoções por mérito, e o diretor de uma das melhores escolas da cidade com base no que fazem ou deixam de fazer no seu tempo livre.

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