São Paulo, segunda-feira, 7 de outubro de 1996
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Viva Brasília

DARCY RIBEIRO

Brasília é uma das poucas coisas que deram certo no Brasil. Não falo das históricas, incomensuráveis, como a conquista do território e o fazimento de nosso povo de milhões de mestiços. Falo dos atos que estão no horizonte de possibilidades do poder federal.
Brasília é o feito maior que um presidente podia propor-se e executar.
Brasília aplacou a ciumeira dos grandes Estados, sobretudo São Paulo, Minas, a Bahia e o Rio Grande, onde o predomínio do Rio de Janeiro, que açambarcava tudo, causava a maior revolta.
Brasília atou o Brasil inteiro, unindo o norte ao sul, o oriente ao ocidente, dando a cada Estado, estivesse onde estivesse, o sentimento de que pertencia a uma pátria grande, à qual estava ligado pela teia das comunicações e dos transportes.
Brasília plantou no interior do país, ao instalar ali a cabeça dos três Poderes, um núcleo de riqueza e modernidade que levaria séculos para lá chegar se não saltasse mil quilômetros desde a costa.
Brasília criou ao seu redor, nos cerrados quase desérticos, a mais ampla província agrícola do mundo, capaz de alimentar de trigo e de soja meia humanidade.
Brasília, graças a Lúcio Costa, reinventou a cidade, se corporificando como um padrão urbano novo.
Brasília, feita pelas mãos do Oscar Niemeyer, é o conjunto arquitetônico mais importante e belo deste século, esplêndido em seus palácios incomparáveis e em todas suas edificações avançadíssimas que o mundo culto olha com espanto e admiração.
Brasília viu, com alegria, que o Lago do Lúcio se enchia mesmo, até alcançar as dimensões de duas baías da Guanabara.
Brasília, ao contrário do que a oposição vaticinava e nós temíamos, não fez as árvores crescerem raquíticas e tolhidas, como a vegetação do cerrado. Lá, as árvores crescem melhor que em qualquer outro lugar. A secura desértica dos primeiros dias deu lugar a um clima delicioso, sem frios e sem calores maiores.
Brasília fixou nos ermos de Goiás um povo moderno e belo, que forma o corpo de consumidores mais rico do Brasil, capaz de importar, para lá comer, tudo de melhor em frutas, peixes e carnes produzidos por toda parte.
Brasília, afinal, cumpriu a destinação dos cinco contemporâneos que a sonharam e a criaram. Lúcio e Oscar, que são o melhor que a cultura do Rio produziu. JK e Israel, os mais ousados fazedores que o Brasil teve. E eu, que levei para lá a casa do espírito, que é minha universidade.

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