São Paulo, quinta-feira, 10 de outubro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Agricultura e (ainda) mentiras a FHC

ALOYSIO BIONDI

O presidente da República está sendo convencido de que a situação da agricultura é cor-de-rosa. Nos últimos dias, a imprensa foi inundada por manchetes e artigos sobre as perspectivas da nova safra, nos quais se faz a defesa da "nova política agrícola" e, principalmente, se procura desmoralizar os protestos contra o arrocho no crédito para o plantio.
A realidade, que é negra, pode ser encontrada pelo presidente FHC no próprio noticiário "montado" e "encomendado" pela sua equipe econômica.
Ele mostra nova queda no plantio, risco de carestia por causa da falta de estoques e expectativas de aumento de safras dependentes do comportamento de São Pedro, isto é, das condições climáticas. Eis as provas:
* "Lavagem" - em manchete de primeira página, o jornal especializado "Gazeta Mercantil" alardeia: "Campo produz mais grãos com menos recursos" (edição de 08/10/96).
Dentro das técnicas de "lavagem cerebral" a que a sociedade brasileira tem sido submetida, a manchete sugere, subliminarmente, que a agricultura não precisa de "mais" crédito para plantar e produzir 80 milhões de toneladas neste ano -exatamente como a equipe econômica diz.
* Plantio - verdade? Nas páginas internas do jornal, o noticiário mostra o oposto.
Atenção: não se pode acreditar nos títulos, é preciso ler os textos para chegar às conclusões. Vamos lá. Título: "Plantio de milho deve ser 18% maior no Sul do país".
Texto: o título está errado. A área plantada não cresce: oscila de 4,6 para 4,7 milhões de hectares. E a produção "prevista" deverá subir 18%.
Outro título: "A safra de feijão deve crescer 11,5%". Texto: a área plantada no Paraná cairá 4%. Em Santa Catarina, "deve ficar inalterada".
Outro título: "Algodão migra para o Centro-Oeste". Texto: para o país como um todo, o governo prevê aumento de 7%, que já seria insignificante, pois a área plantada vem caindo ano a ano (o Brasil passou de exportador de algodão a segundo maior importador do produto. No mundo).
Pois os produtores discordam até mesmo desses 7%. No Paraná, a área deve cair 33%, diz o mesmo noticiário. E o arroz? Nova queda de 5% na área plantada no Rio Grande do Sul, onde o Banco do Brasil está financiando "apenas 40% da área plantada, contra 68% em anos anteriores".
Alguém precisa mostrar esses dados ao presidente FHC.
Iludindo
Para defender sua política de massacre, a equipe econômica publicou artigo na imprensa assinado pelo secretário de Política Econômica da Fazenda, José Roberto Mendonça de Barros, e dois assessores. Eles asseguram "recuperação na área plantada na safra 1996/97". Os dados acima desmentem.
Sem fundamento
Os articulistas oficiais citam um aumento de 13% nas vendas de fertilizantes aos produtores do Centro-Sul, no período de janeiro a julho, na comparação com 1995, como uma pista indicadora de plantio maior.
Enganaram-se, ou estão tentando enganar o presidente. Quem comprou adubo nessa época do ano foram basicamente os produtores de trigo, uma cultura de inverno.
Por que eles puderam comprar? Porque ganharam dinheiro no ano passado, graças à alta dos preços mundiais. Foi o único setor agrícola a capitalizar-se, enquanto os milhões de produtores restantes eram massacrados.
Ameaça real
Desde o começo do ano, a equipe FHC mentiu sobre a existência de estoques de alimentos no país. A manipulação foi feita confundindo-se as estatísticas sobre estoques antigos do governo e os estoques da nova safra, dados em garantia de empréstimos, que são suficientes apenas para o consumo do ano. Agora, o artigo confessa que os estoques públicos são "bastante reduzidos". Literalmente, "bastante". Ameaça de desabastecimento.
Com plantio menor, a "grande safra" passa a depender do clima. O risco em 96 é dobrado: "La Niña" voltou, segundo os especialistas, que prevêem chuvas torrenciais e períodos de seca neste verão que se aproxima.

Texto Anterior: O mito da empresa transnacional
Próximo Texto: Cúpula vai discutir regras comerciais
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.