São Paulo, sexta-feira, 11 de outubro de 1996
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O dinossauro retorna

INÁCIO ARAUJO
DA REDAÇÃO

Jean-Luc Godard é, talvez, o último dos dinossauros. Ou, em todo caso, aquele que não usa disfarces, o que "Detetive" (Bravo Brasil, 12h e 20h) parece existir para comprovar.
O tempo é o da indústria cultural triunfante. Dos filmes "para público". Godard caminha ostensivamente no sentido oposto.
"Detetive" tem valor de troca? Nenhum. O espectador está em seu pleno direito se disser que o filme não vale o preço do ingresso, ou que não paga o tempo perdido.
A arte de Godard consiste, exatamente, em quebrar expectativas. Quem espera uma história de crimes, morte e investigação tende mesmo a chiar. Embora tudo isso esteja lá, não é o que se vê.
Mas, como estamos em tempos de Bienal, talvez seja o momento de lançar um outro tipo de olhar a seus filmes (inclusive esse). Como num quadro de Picasso, a mesma imagem se acumula, por camadas, mostra seus vários aspectos. Como numa instalação, a figura privilegiada não é a arte, mas a experiência que se faz.
A coerência não vem do encadeamento de acontecimentos, não está na narrativa, mas nas séries de figuras que se formam sob nossos olhos.
O "problema Godard" é semelhante àquele que distancia o espectador da arte moderna, como incompreensível, por não estar apoiada numa história, ou em figuras.
É verdade, pode ser difícil "entender" a arte moderna. Mas, se você olha em torno de si e observa a cadeira em que está sentado, percebe que todos estamos sentados, literalmente, numa sensibilidade que não existiria sem a arte moderna. Com o cinema não é tão diferente: ele é o grande renegado, mas, olhando com atenção os filmes feitos hoje, vemos o quanto esse olhar é moldado por Godard.
(IA)

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