São Paulo, sábado, 12 de outubro de 1996
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Superbanda de Hancock enfrenta acústica precária do Galpão Fábrica

CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Frente a uma platéia excitada, que lotou os 1.600 lugares da sala Main Stage, o pianista norte-americano Herbie Hancock comandou anteontem o show mais esperado da primeira noite do Free Jazz.
O "frisson" do público era compreensível.
Ver uma banda de feras do jazz contemporâneo como a New Standard All-Stars era um privilégio quase único. Nem as platéias norte-americanas ou européias puderam ouvi-la ao vivo, durante a última temporada de festivais.
Valorizando o encontro raro, Hancock introduziu os parceiros ilustres antes mesmo de se sentar ao piano: Michael Brecker (sax), John Scofield (guitarra), Dave Holland (baixo), Jack DeJohnette (bateria) e Don Alias (percussão).
Pena que a acústica precária do Galpão Fábrica quase tenha estragado a festa. Os ajustes de som efetuados durante e após o show da cantora Ernestine Anderson ajudaram um pouco, mas ainda ficaram longe de resolver o problema -estrutural, ao que tudo indica.
Depois de fazer sinais para os técnicos, Hancock desabafou: "Sinto muito, mas esse não é um bom lugar para se tocar."
Ainda assim, descontando tudo o que a acústica deficiente da sala impediu de ouvir, não faltaram exibições de virtuosismo instrumental e muita animação.
Tocando faixas do último álbum de Hancock, "The New Standard" (Verve/Polygram), o sexteto demonstrou quase didaticamente a característica mais original do jazz: ser um gênero musical em permanente mutação.
Um ano após a gravação do disco, cujo repertório destaca hits da música pop recriados sob a estética do jazz, Hancock e seus parceiros exibiram no show de anteontem versões bem mais vibrantes e complexas musicalmente.
Foi o que se ouviu desde o primeiro número, "Mercy Street" (de Peter Gabriel), seguida por "Norwegian Wood" (de Lennon & McCartney) e "New York Minute (de Don Henley).
"Nós mudamos um pouquinho. Tinha que soar mais pessoal", justificou Hancock, com humor, ao anunciar "You've Got It Bad Girl" (de Stevie Wonder).
Mas foi durante o funk "Thieves in the Temples" (do ex-Prince) que a platéia mais vibrou, excitada com o longo -e muito bem-articulado ritmicamente- solo do saxofonista Michael Brecker.
Quem abriu a noite, no Main Hall, foi a cantora norte-americana Ernestine Hall, mais prejudicada ainda pelo som precário, que em alguns momentos parecia sair de uma câmera de eco.
"Não está muito alto? Vocês estão ouvindo bem mesmo?", perguntou ela, preocupada, logo após o primeiro número.
Cantando clássicos do jazz, como "All Blues" (Miles Davis), "In a Mellow Tone" (Duke Ellington) e "Night in Tunisia" (Dizzy Gillespie), Ernestine provou ao vivo que -apesar de alguns críticos que sempre a esnobaram- seu lugar entre as grandes ladies do gênero está mais que garantido.

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