São Paulo, domingo, 13 de outubro de 1996
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Urnas expõem Brasil 'multicultural', de índios a gays

MAURICIO STYCER
DA REPORTAGEM LOCAL

O Brasil ainda está longe de ser o paraíso multirracial e étnico descrito por Gilberto Freyre, mas o país que saiu das urnas, no último dia 3, parece um pouco mais real.
Oiapoque, no extremo norte do país, no Amapá, elegeu o primeiro prefeito índio da Amazônia, João Neves, da tribo galibi marworno.
São Paulo, a maior cidade do país, consagrou com mais de 48% dos votos válidos um homem negro, Celso Pitta. Se vencer no segundo turno, será o primeiro negro eleito prefeito da cidade.
Pitta vai disputar o segundo turno contra uma nordestina, Luiza Erundina, a primeira mulher a ser prefeita de São Paulo (1989-92).
Outros negros obtiveram bons resultados. Em Aracaju, Ismael Silva foi para o segundo turno.
Em Araçuaí, uma cidade de 40 mil habitantes numa das regiões mais pobres de Minas Gerais, uma mulher negra venceu os caciques locais com 65% dos votos -uma façanha tripla, na sua opinião. "Imagine uma mulher, negra e pobre administrar essa cidade?".
Japoneses, italianos... Um descendente de japoneses, Cassio Taniguchi, venceu fácil a eleição em Curitiba.
Uma rápida olhada na lista de prefeitos e vice-prefeitos eleitos em São Paulo mostra que não faltarão descendentes de japoneses no comando de mais de uma dezena de cidades do Estado.
A pequena Pedrinhas Paulista, fundada por italianos no interior de São Paulo, elegeu possivelmente a dupla mais politicamente correta da temporada: uma mulher, filha de italianos, para o cargo de prefeita, e um descendente de japoneses como vice.
No Sul do país, descendentes de alemães, poloneses e italianos conquistaram algumas prefeituras. Porto Alegre, que já teve um prefeito negro (Alceu Colares), elegeu desta vez Raul Pont, que tem um bisavô francês.
Gays em baixa Um dos grupos minoritários mais barulhentos nesta eleição acabou não obtendo o resultado esperado. Dos 12 candidatos a vereador que se declararam publicamente homossexuais em todo o país, apenas 1 se elegeu.
O travesti Kátia Tapeti obteve uma votação consagradora em Colônia do Piauí, tornando-se o vereador mais votado da cidade e, com isso, habilitando-se para disputar a presidência da Câmara em 97 e a prefeitura no ano 2000.
Um outro grupo que costuma enfrentar preconceitos na política, formado por padres e freiras, saiu-se bem melhor. Vereadores e prefeitos de batina ou hábito serão vistos a partir de 96 em inúmeras cidades, como Santa Rita, no Maranhão, que será dirigida por Osvaldo Marinho Fernandes, conhecido por todo mundo no local apenas como padre Osvaldo.
Árabe ou corintiano? A cientista política Maria Tereza Sadek, do Idesp (Instituto de Estudos Econômicos, Sociais e Políticos), acha que o sexo ou a origem étnica de um candidato não resolve, em si, nenhum problema.
"Não basta ser japonês para ser porta-bandeira dos japoneses", diz Sadek, citando o caso de José Izar, advogado do Corinthians, que foi eleito vereador em São Paulo menos por ser descendente de árabes do que por seu trabalho futebolístico.
"Fora isso, questiono se essas bandeiras (de grupos minoritários) precisam estar presentes no parlamento. Não importa as características demográficas, de sexo ou etnia dos candidatos, mas as propostas que defendem", diz.

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