São Paulo, sábado, 19 de outubro de 1996
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Ortega enfrenta oposição e diz ter mudado

NEWTON CARLOS
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Por meio de declaração do Departamento de Estado, recriminando o passado político de Ortega, pela primeira vez os EUA assumiram posição pública contrária a um candidato presidencial em eleições num país do continente.
Prova de que Washington, mesmo acabada a Guerra Fria, ainda não se dispõe a sepultar as razões que levaram o governo americano a financiar um dos bandos de uma das guerras mais cruentas na história da América Latina.
Posição inversa do que acontece na própria Nicarágua: a 18 de setembro, a Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) assinou acordo de não-beligerância com os "contras", antes instrumento dos Estados Unidos.
Não recuperados da derrota eleitoral em 1990 e recém-saídos de violentas disputas internas, que resultaram em constrangedora lavagem de roupa suja, expulsões, deserções e na candidatura dissidente de Sérgio Ramirez, os sandinistas decidiram mudar de cara, de beligerante para pacifista.
Ramirez, um respeitado sociólogo, não tem nenhuma chance de vitória. Está entre os últimos nas pesquisas. Mas sua presença em palanques e debates é referência viva e desgastante de uma oposição à FSLN saída de "dentro", que não pode ser acusada de "reacionária".
Figuras como o padre Ernesto Cardenal, um dos principais fiadores do sandinismo junto aos cristãos, abandonaram o partido com Ramirez, atirando grosso, com denúncias de corrupção.
A partir de setembro, quando Ortega começou a aproximar-se de Arnoldo Alemán nas pesquisas, os ataques contra ele aumentaram em ferocidade.
Alemán encerrou sua campanha, diante de 30 mil partidários, proclamando que "é preciso impedir de qualquer jeito a volta dos sandinistas". Uma não muito bem definida associação de cidadãos que tiveram bens confiscados durante o sandinismo patrocina grande parte da campanha.
No encerramento de sua campanha, em presença de 100 mil pessoas, Ortega compareceu vestido de branco e em companhia de sua numerosa família. Aposentou os trajes militares. "Os tempos mudaram", afirmou. Em vez de hinos sandinistas, foi tocada a Nona Sinfonia de Beethoven, que fala de "amor, fé e esperança".
Não houve nenhuma citação de Sandino, o inspirador da FSLN, que pegou em armas contra a intervenção dos EUA em 1933.
Nenhuma figura polêmica, como o comandante Tomás Borge, ex-ministro do Interior, ou o irmão Humberto Ortega, ex-comandante do Exército, ao seu lado. Mensagem conciliadora e promessas de adoção de programas sociais que beneficiem os pobres.
Ortega também admite erros, sem esclarecê-los, e garante que nunca mais haverá serviço militar obrigatório na Nicarágua, segundo analistas o motivo maior da derrota em 1990. Por último, um "pedido a Deus para que nos ajude a aprender e perdoar".

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