São Paulo, sábado, 19 de outubro de 1996
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Reeleição sem eleição

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Do jeito como estão indo as coisas, com os liberais e neoliberais cada vez mais apavorados com a possibilidade de um confronto com Paulo Maluf, nada de admirar que as forças vivas da nacionalidade que articulam a reeleição sem desincompatibilização queimem de vez todas as etapas e decidam manter FHC na Presidência sem eleição. Para quê?
Entravar o processo de modernização, correr o risco da demagogia desenfreada que campeia durante as campanhas eleitorais, perder tempo com a ida do candidato aos grotões da pátria a fim de comer buchada de bode? Isso é moderno? É inteligente?
O atual esquema de poder considera-se forte o bastante para alterar a Constituição e aprovar a reeleição-já. Creio que é consenso nacional o princípio da reeleição -mas a partir do próximo mandato. Evidente que, aprovada a reeleição, não faz sentido submeter o país a uma interinidade forçada de seis meses, a fim de impedir que o presidente use a máquina para se reeleger.
Mesmo assim, o Brasil não suporta, depois de 496 anos de marasmo e boçalidade, perder mais tempo com uma campanha eleitoral tendo, como já tem, o presidente ideal, nascido de uma gentil mistura de Voltaire e Eça de Queiroz, de dr. Pangloss e Conselheiro Acácio.
Maluf entra, no raciocínio acima esboçado, como hipótese de trabalho. Ele substitui Brizola em 1989 e Lula em 1994. Por aí se vê como o mundo dá voltas e como a política, que já era a arte do possível, tornou-se a realidade do impossível.
O preço dessa jogada moderna e modernizante será, um pouco mais ou um pouco menos, o mesmo da reeleição pura e simples.
Um governo que usa medida provisória, que sem consultar ninguém da noite para o dia muda as relações de trabalho de 150 milhões de seres humanos, é capaz de façanhas iguais àqueles programas da TV: além da imaginação.

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