São Paulo, segunda-feira, 21 de outubro de 1996
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Paraíso do futebol

JUCA KFOURI

Escrevi aqui ontem que a CBF é uma empresa sem concorrentes, que não paga impostos e não tem fiscalização. Tudo sob a alegação de ser uma entidade privada, sem fins lucrativos -o que vem a ser um problema para a Receita Federal.
Tão grave quanto, e aí o problema é do Ministério dos Esportes, a CBF é regida por um estatuto ilegal, em confronto com a Lei Zico.
Basta dizer que o estatuto da CBF dificulta a criação de ligas, coisa que a lei permite e até incentiva (significa dizer, em tese, que a CBF apenas permitirá a criação de ligas que não botem seu poder em risco, como a recém-fundada Liga do Rio de Janeiro).
Se não bastasse, o estatuto só dá direito de voto aos clubes da primeira divisão nacional (24), além das federações estaduais. A lei, porém, determina que todos os clubes que disputam torneios nacionais tenham direito de voto, o que incluiria os clubes da segunda e terceira divisões, assim como os participantes da Copa do Brasil -mais de cem, ao todo. E a Assembléia Geral, que aprova as contas da CBF exclusivamente com a participação das federações, também está em desacordo com a lei.
Por que tal ilegalidade persiste aos olhos de todos?
Há quem diga que uma intervenção na CBF seria uma violência e que a reação da Fifa não tardaria -embora a federação italiana esteja sob intervenção e, a Fifa, calada.
É que falta vontade política para que se abra a caixa preta do futebol no Brasil.
A CBF brinca com a opinião pública impunemente. É capaz, por meio de seus agentes na imprensa, de anunciar a assinatura pública de um contrato milionário com a Nike.
O que aconteceu nos bastidores, no entanto, permanece oculto, com beneficiários que só os sinais exteriores de riqueza repentina revelam.
É necessário reiterar, por dever de coerência, que a CBF deveria ser dirigida profissionalmente e remunerar adequadamente seus executivos, bonificando-os pelos ganhos extraordinários (econômicos e esportivos) que proporcionassem.
Mas não pode continuar a ser uma espécie de paraíso fiscal funcionando, por ironia, na rua da Alfândega, e acima das leis brasileiras.
Que cada vez mais jornalistas sejam coniventes com isso é uma triste comprovação de que, de fato, quase todos têm seu preço. Mas que as autoridades permaneçam surdas, mudas e cegas para tamanho acinte já é demais.

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