São Paulo, terça-feira, 22 de outubro de 1996
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O ensino da violência

JANIO DE FREITAS

As soluções que sejam a um só tempo ilegais e violentas são, sempre, as que ocorrem de imediato ao atual governo. Se faltassem exemplos nesse sentido, o pacotaço da semana passada proporcionou-os em formas e número para preencher qualquer necessidade de demonstração. Mas não para preencher a necessidade de prepotência do pessoal do governo.
A educação tem sido um dos pastos prediletos das investidas da cavalaria governista. Não há mistério no motivo da preferência, não se precisando mais do que unir dois momentos de Paulo Renato Souza. No primeiro, indagado sobre problemas pedagógicos decorrentes da decisão de incluir educação sexual nas escolas, deu sua resposta como ministro da Educação e, assim, responsável pela pedagogia em todos os níveis do ensino: "Isso não é comigo. Eu não sou pedagogo, sou economista".
Esse "sou economista" já diz muita coisa. Mas o segundo momento também vale a pena. Recrudescido agora o problema das mensalidades escolares, o que faz o economista-ministro da Educação? Faz algumas declarações inconclusivas, para cumprir a regra palaciana de estar todos os dias nos jornais, e chuta o problema para a Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda. Como se o custo do ensino não fosse, sempre, um dos componentes primordiais e decisivos da educação -tanto a educação individual, como em termos nacionais.
Desde os tempos rendosos em que, neste mesmo governo, esteve entregue a José Milton Dallari e depois ao carnavalesco Luiz Paulo Vellozo Lucas (o ipanemense que a desinformação capixaba elegeu prefeito de Vitória), aquela secretaria não passa de um teatro mambembe. Sua finalidade é fingir que o governo está buscando alguma solução para um problema de preço ou abastecimento -e em seguida beneficiar, não por acaso, o lado com maior poder financeiro.
O problema das mensalidades já não é só o de sua altitude, que faz parte da política econômica, mas também o do aumento acelerado de atraso nos pagamentos. A solução do governo, é claro, consiste na autorização às escolas para "punirem os pais e os alunos inadimplentes". Entre as diversas punições mencionadas pelo secretário Bolívar Moura Rocha, uma brutalidade ilegal: a retenção dos documentos do aluno, impedindo sua inscrição em outra escola, mesmo que pública e gratuita.
É importante notar que as punições estão sendo definidas depois de a secretaria constatar, segundo o próprio Bolívar Moura Rocha, que "o principal motivo dos atrasos é que as escolas aumentaram muito o valor das mensalidades de uns anos para cá". Ele não podia dizer, mas foi da liberdade de aumento que tiveram no período URV-real. Há centenas de processos por aumento abusivo de mensalidade, mas, até hoje, só uma dezena deles chegou a se transformar em notificação à escola.
O governo quer punir a criança e o jovem pelo problema que o pai ou responsável tenha com a escola. Nem se precisa imaginar as repercussões na psicologia infantil e juvenil, por certo definitivas em muitos casos, decorrentes das punições em formulação no governo. Neste capítulo haveria de entrar, tanto quanto a psicologia, a criminalidade acobertada pela impunidade oficial. Fiquemos no mais barato: a pretendida retenção dos documentos de um aluno, impedindo-o de continuar os estudos, é mais uma "solução" em que o governo une ilegalidade e violência.

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