São Paulo, sábado, 26 de outubro de 1996
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Juizado de instrução

CARLOS HENRIQUE ABRÃO

A violência nas grandes cidades, somada à degradação dos costumes, ao lado da inabilidade do Estado de prover os meios necessários e, fundamentalmente, o dogma da impunidade, fizeram com que recrudescesse o cenário da macrocriminalidade organizada, diversificando e ramificando os pontos de atuação.
O sentimento de impotência faz renascer o pensamento da pena de morte e, ainda, da redução da imputabilidade penal, a qual seria enquadrada na faixa dos 16 anos, a mesma válida para a cidadania plena do eleitor.
Uma radiografia sumária do modelo permite destacar o quadro sombrio da investigação penal, lenta, claudicante, sem objetividade em muitos casos, não se alcançando os subsídios indispensáveis à discussão da culpabilidade do indiciado. Sem falar nas sucessivas prescrições por causa do decurso do lapso temporal, beneficiando o agente, em detrimento da sociedade desamparada.
Baseado no artigo 129, 7º, da Constituição Federal, o procurador-geral da Justiça de São Paulo determinou que o Ministério Público acompanhasse mais de perto a atividade investigatória policial, realizando visitas aos distritos e observando a efetividade do procedimento, para o diagnóstico preciso daquilo que radiografa a debilidade do órgão, com a lotação das cadeias, reduzido número de funcionários e informatização incipiente.
Embora alvo de polêmica inicial, a medida é salutar e encontra respaldo na ordem constitucional, do próprio, controle externo, ganhando corpo no aspecto do Juizado de Instrução, característica evoluída de sua consecução. Sobredito instituto: tem plena eficiência nos países da Europa Ocidental, atravessando período de crise, conseguindo superar as mazelas da burocracia e reduzir a corrupção, tendo vários adeptos na Itália e na França.
Significa o Juizado de Instrução a forma pela qual age a polícia judiciária, dotada de plenos poderes investigatórios, confiando-se-lhe a colheita da prova, a cargo do próprio juiz, inibido do julgamento do caso. Emergente discussão levou ao debate sobre a investigação, sob o prisma de sua direção, tendo Carnelutti e Donnedieu de Varbres se inclinado favoráveis ao Ministério Público para encaminhamento investigatório. Ganha corpo o tema, com o advento da lei 9.099/95, institucionalizando os juizados especiais criminais, acarretando acalorada ponderação sobre a atividade propriamente dita da autoridade policial. Malgrado a experiência e o estágio embrionário de sua implantação, somente o Juizado de Instrução dirimiria qualquer dúvida, à medida que o interessado na colheita da prova indiciária saberia distinguir o importante do acessório a eliminar eventual controvérsia.
Conferir o poder de instrução ao promotor de Justiça ou ao magistrado parece ser polêmica ligada à atribuição de competência, cuja imprescindibilidade traria uma persecução penal transparente, efetiva, eficaz, sem qualquer "capitis diminutio" à autoridade policial, mantendo-se a respectiva independência, apesar daqueles não simpatizantes do modelo, cujas razões diversas não inibem a respectiva implantação amplamente favorável à completa apuração da responsabilidade penal.

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