São Paulo, terça-feira, 29 de outubro de 1996
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O Brasil importa (até) soja

ALOYSIO BIONDI

O Brasil está precisando importar até soja, da qual é o segundo maior produtor mundial, logo atrás dos EUA. É mais um foco de sangria de dólares a agravar o rombo da balança comercial (exportações menos importações) do país.
Até agora, sabia-se que o Brasil precisaria gastar dólares preciosos com a compra, lá fora, de grandes volumes de milho, trigo e arroz (além do algodão), devido à redução nas colheitas, provocada deliberadamente pela equipe econômica de Brasília.
Na sexta-feira, porém, surgiu a novidade: as cotações da soja subiram na Bolsa de Chicago devido à compra de 300 mil toneladas de grãos pelo Brasil. Como as colheitas brasileiras ocorrerão somente daqui a alguns meses, pode-se prever novas importações de vulto neste futuro próximo.
A operação em Chicago é um novo sinal amarelo a alertar o presidente da República para a necessidade de uma política de emergência, capaz de ampliar substancialmente o plantio agrícola da safra atual, intenção que continua a ser sabotada pela equipe econômica. As importações de alimentos vão agravar o problema que -embora fosse previsto há meses por esta coluna- provoca inquietação no momento: o salto no rombo da balança comercial.
O Brasil precisa garantir agora, já, grandes colheitas para 1997, obtendo excedentes para exportar -ou o problema cambial ganhará proporções incontroláveis.
A sabotagem
Continua a faltar crédito para o plantio. Há poucos dias, o presidente deu um "puxão de orelhas" público em funcionários do segundo escalão e no Banco do Brasil, que estariam dificultando a concessão de empréstimos aos produtores. A reprimenda é injusta.
Na realidade, o "arrocho" no crédito rural é uma decisão da própria equipe econômica. Mais uma prova disso? Ainda na sexta-feira, a imprensa publicava entrevista do diretor de Crédito Rural do Banco do Brasil, Ricardo Conceição. Segundo ele, a liberação de empréstimos aos agricultores "está limitada pela capacidade do Tesouro Nacional em equalizar as taxas de juros".
Explicando em português: como o crédito rural tem as taxas de juros "tabeladas" pelo governo, cabe ao Tesouro pagar (aos bancos) a diferença entre esses juros e os praticados no mercado (na verdade, pagos na captação).
O que isso significa? Na prática, o ministro da Fazenda e sua equipe fixaram qual a verba total, em milhões de reais, a ser gasta no pagamento da diferença -para, a partir daí, calcular qual o valor do crédito a ser destinado à agricultura.
Mantendo o "arrocho", a equipe de Malan fixou um valor baixo para pagar o subsídio. Racionou o crédito. É isso que está sendo escondido do presidente FHC: o massacre prossegue.
A esta altura, há mais um motivo para dar prioridade à agricultura: ela pode produzir dólares para reduzir o rombo da balança comercial.
Governadores
Em sua maioria, os Estados brasileiros dependem decisivamente da agricultura para criar empregos, gerar renda, consumo -e impostos. Engraçado: a maioria dos governadores se prostra ao chão, lambe os sapatos de executivos de multinacionais que acenam com a instalação de uma fabriqueta em seu território. E a maioria dos governadores está de braços cruzados, silenciosos, diante do massacre da agricultura.
Prefeitos
Mais de 4.000 municípios brasileiros dependem basicamente da agricultura, segundo as estatísticas oficiais. Engraçado: os prefeitos também não movem uma palha para protestar contra o massacre dos agricultores.
Há tempo
No Centro-Sul, a época de plantio para algumas culturas já se esgotou em várias regiões. Um programa de emergência, no entanto, pode identificar novas oportunidades de plantio (safra da seca, safrinhas etc.) para a colheita de 1997. E apoio para aumento de produtividade. Governadores e prefeitos, sob coordenação federal, implantaram o programa.

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