São Paulo, quarta-feira, 30 de outubro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Desejos reprimidos marcam 'Anjos e Insetos'

MARILENE FELINTO
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Que relação poderia haver entre a selva amazônica de meados do século 19 e a Inglaterra vitoriana?
A essa pergunta o diretor americano Philip Haas responde em seu "Anjos e Insetos": as forças da natureza, que movem tanto a espontaneidade dos bichos quanto os desejos reprimidos dos homens.
Haas tirou da novela "Morpho Eugenia", da escritora inglesa A.S. Byatt ("Possession", 1990, e "Babel Tower", 1996), o confronto entre o naturalista William Adamson, recém-saído de dez anos de pesquisas na Amazônia brasileira, e a aristocrata família inglesa dos Alabaster.
Haas estende ao máximo de tensão o universo de repressões da era vitoriana, num filme que pode soar sem ritmo, mas que, na verdade, apenas optou por uma linguagem que expressasse a atmosfera sufocante das metamorfoses animais e humanas.
Correm os anos de 1860 quando o naturalista inglês William Adamson (Mark Rylance) volta da Amazônia para a Inglaterra, onde se emprega em casa de Harald Alabaster para organizar um arquivo de ciências naturais. Adamson logo se apaixona pela filha mais velha de Alabaster, Eugenia (Patsy Kensit).
"Morpho Eugenia" é também o nome de uma rara borboleta da Amazônia. Começa nessa analogia o estudo da morfologia de uma família vitoriana (anjos na aparência), sempre confrontado com o estudo da morfologia dos insetos que Adams pesquisa, especialmente borboletas e formigas.
Em "Anjos e Insetos", tudo é contado aos poucos na narrativa lenta e sob o ponto de vista do cientista, que se vê dividido entre a artificialidade das etiquetas do mundo de Eugenia (a borboleta) e a presteza e inteligência da governanta Matty (a formiga).
Dessa oposição entre o mundo das formas, fundado na repressão e na contenção vitoriana, e o mundo sem segredos dos insetos, vai-se desvendando o que há de sempre irreprimível nas forças da natureza: sexo e incesto no mundo decadente dos Alabaster, transformação constante no mundo dos casulos de borboletas ou no organizado socialismo dos formigueiros.
"Anjos e Insetos" participou da seleção oficial do festival de Cannes de 1995. O diretor Haas ("Jogando Com a Sorte"), se não faz de seu filme nenhum grande espetáculo de imagens em movimento, ao menos traça com cores intensas um quadro do surgimento do humanismo no seio de um regime anacrônico e apodrecido.

Vídeo: Anjos e Insetos
Produção: Inglaterra/EUA, 1995, 117 min.
Lançamento: HVC Filmes, (011) 289-3825

Texto Anterior: Horne traz sutileza da voz madura
Próximo Texto: Os mais retirados da semana
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.