São Paulo, quinta-feira, 31 de outubro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

As ambições de Cavallo

CELSO PINTO

Domingo Cavallo, ex-ministro da Economia da Argentina, só não anuncia sua candidatura à Presidência para 99 porque ela depende de circunstâncias favoráveis. "Se tivesse uma oportunidade como a que teve o presidente Fernando Henrique Cardoso, mergulharia de cabeça nela", disse Cavallo a esta coluna.
Com quem Cavallo poderia se aliar para chegar à Presidência? Nas suas contas, as principais forças políticas argentinas se dividem da seguinte forma: os liberais (na tradição européia, como ele) têm 15% dos votos, os justicialistas (peronistas) têm 30%, os radicais (do ex-presidente Alfonsín) têm 20% e a esquerda tradicional outros 15%.
Ele sabe ser rejeitado pelo peronismo tradicional, mas diz que Menem não conseguirá governar sem aliar-se aos liberais. Uma aliança com os radicais seria impossível: embora eles se classifiquem como liberais são, segundo Cavallo, fortemente intervencionistas.
Curiosamente, ele acha mais provável uma aproximação com a esquerda tradicional. Seu avô foi filiado ao partido socialista e Cavallo diz ter simpatia em relação à agenda social dos socialistas tradicionais (que depois foram derrotados pelo populismo peronista). "Os socialistas argentinos não são contra o mercado, são contra políticas que privilegiem grupos, mas toda sua ênfase é menos econômica do que social", define.
Cavallo admite, aliás, que a agenda pós-estabilização deve ter muito mais ênfase na área social. Especialmente em três pontos: educação, saúde e funcionamento da justiça, cuja ineficiência traz enormes custos econômicos e sociais. Na área de educação básica, ele acha que houve avanços nos últimos anos na Argentina, mas não na área de saúde, que ele acha desastrosa. São temas que certamente estarão incluídos na agenda política de Cavallo.
Seu tiroteio contra as máfias argentinas e a corrupção vai continuar, por duas razões. Uma é que Cavallo acha que a Argentina corre o risco de ser engolida pelas máfias, o que seria um desastre. Outra é que, como as máfias querem destruí-lo, ele vai tentar destruí-las antes.
Não existe o risco de desestabilizar o presidente Menem, diz ele, nem a intenção de atacá-lo diretamente, a menos que ele tome partido dos mafiosos. Cavallo acha saudável discutir publicamente estas questões, mesmo que de forma apaixonada.
Cita o exemplo do México que, graças a um marketing competente, convenceu o mundo que sua economia e sua política andavam às mil maravilhas, quando estavam em frangalhos. A força dos sistemas políticos argentino e brasileiro são, para Cavallo, a melhor garantia de que não repetirão o México.
Menem já disse, recentemente, que Cavallo foi para a oposição. Seu otimismo em relação à economia argentina, contudo, continua inabalado. Ele projeta um crescimento próximo a 4% para a economia neste ano, 5% no próximo e, a partir daí, acha que a Argentina passará a crescer, de forma sustentável, 7% ao ano, como o Chile na última década.
Não vê qualquer problema na reativação da economia, ao contrário. "Sou um amante do crescimento", define. Ele acha estas taxas compatíveis com equilíbrio na balança comercial e na política fiscal.
Na palestra que fez à convite da Credicard, deu um recado claro. Existe uma incompatibilidade entre a política fiscal frouxa do Brasil e a estabilização. No entanto, o Brasil, ao contrário da Argentina, tem tempo, 3 a 4 anos, para corrigir estas inconsistências. A solução, contudo, terá que vir pelo lado fiscal. Seria um brutal equívoco mexer na política cambial: traria de volta a inflação, sem resolver os problemas reais de ampliar a competitividade e a poupança.
Cavallo acha razoável o direito à reeleição com um mandato de quatro anos. Só que é preciso que a reeleição não comprometa as reformas fiscais. Na Argentina, lembra, o desejo de Menem obter a reeleição acabou levando-o a fazer alianças com os radicais em 92 e 93 que atrapalharam o ajuste econômico.
Caixa alta
Cobrando US$ 20 mil por palestra e com a agenda cheia (foram sete palestras recentes só em São Paulo), Cavallo não terá problema para acumular um bom fundo eleitoral.

Texto Anterior: Assembléia paulista estende mandatos de fazenda no Paraná; Covas quer antecipar pagamento de 13º
Próximo Texto: Advogados de Pitta tentam impedir Erundina de apresentar apoiadores
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.