São Paulo, quinta-feira, 31 de outubro de 1996
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Banqueiro estrangeiro não é otário

ALOYSIO BIONDI

O governo FHC agiu com rapidez, para combater o início de pânico provocado pelas notícias de que as exportações brasileiras continuavam a despencar em outubro, provocando outro salto no rombo da balança comercial (exportações menos importações). Na contra-ofensiva, Brasília anunciou que, na quarta semana do mês, houve forte reação nos embarques para o exterior, "principalmente de minérios".
A ação fulminante é plenamente justificável: a desconfiança provocada pelos problemas da balança comercial traz o risco de alarmar o investidor/aplicador estrangeiro e provocar uma "fuga de dólares". Ela traria desdobramentos graves, como o aumento das pressões para que o governo realize uma desvalorização do real, capaz por sua vez de trazer indesejáveis altas de preços e inflação, ao encarecer importações e aumentar as dívidas (em dólar) de empresas e governo.
Esforço inútil
Explicações otimistas não bastam para afastar todos esses riscos. Ao contrário da sociedade brasileira, anestesiada por de-formadores de opinião, os banqueiros e investidores/especuladores internacionais não são crédulos. Não vão perder tempo discutindo se a anunciada "reação" nas exportações é mera manipulação, ou resultante de uma ordem superior para a Vale do Rio Doce acelerar embarques de minério e engordar as estatísticas. Para eles, o importante é avaliar tendências de médio e longo prazos, com base em uma série de dados estatísticos. Sem esse critério, o Brasil é motivo de preocupações redobradas.
Olhando-se o comportamento da economia como um todo, os dados estatísticos mostram que as importações tendem a crescer assustadoramente devido ao "escancaramento" do mercado brasileiro. Além disso, há um problema específico, relacionado com as empresas brasileiras que vinham tomando empréstimos gigantescos no exterior. Hoje, elas têm dificuldades em honrar compromissos, por dois motivos. Primeiro: a recessão derrubou suas vendas no mercado interno, criando problemas de caixa. Segundo: com a eterna conveniência do Banco Central, houve uma orgia de operações "frias" ligadas a contratos de exportações no futuro.
Na verdade, a empresa não tinha a mercadoria, que pretende comprar (no futuro) para entregar ao comprador, ou simplesmente pensava em "liquidar" os contratos, com lucro. Como assim? Tratava-se de meras jogadas, conhecidas e toleradas pelo Banco Central, para grandes empresas e bancos intermediadores captarem dinheiro lá fora a juros baixos, e aplicá-los a juros altos aqui dentro, ganhando com a diferença.
Acontece que a disparada dos preços internacionais de produtos agrícolas (ou queda, como no caso do papel e celulose) provocou prejuízos às empresas envolvidas. Os bancos e aplicadores internacionais sabem disso. O Brasil voltou a preocupar. Isso explica, também, o fracasso da venda de novos títulos (bonds) do governo brasileiro no exterior. Não bastam explicações otimistas para mudar o quadro.
O tamanho
Empresa líder do setor de alimentação anuncia que vai refinanciar sua dívida de curto prazo. O tamanho: US$ 740 milhões. Origem principal do endividamento: empréstimos garantidos por exportações. Futuras.
Deslumbrado
Gustavo Franco, diretor do Banco Central, foi à Europa para, com suas palestras, garantir a venda de títulos do governo brasileiro, no valor de US$ 750 milhões. Às vésperas do lançamento, o noticiário babava de entusiasmo. Dizia ele que o interesse era tão grande que Franco já pensava em novas emissões. A venda fracassou. Os de-formadores? Caluda.
Tome nota
Repetindo: o escancaramento do mercado brasileiro às importações não tem nada a ver com a globalização. Para entrar no Brasil, a maioria dos produtos estrangeiros está pagando só 2% de imposto ("tarifa modal"). No Japão, essa proteção aos produtos e indústria locais é sete vezes maior: 15%. Na Coréia, dez vezes maior: 20%. A equipe FHC está destruindo a indústria.

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