São Paulo, quinta-feira, 31 de outubro de 1996
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Peça faz crítica social

FRANCISCO ACHCAR
ESPECIAL PARA FOLHA

A peça de Gil Vicente faz parte de uma trilogia em que assistimos a um desfile de almas de mortos prestes a embarcar para a eternidade. Aqui, eles são confrontados com o Diabo que, com fina ironia, lhes apresenta as razões pelas quais devem embarcar no seu "batel" (navio), que vai para a "terra perdida". Todos resistem e se dirigem ao Anjo, que guarda a barca do paraíso. O Anjo, em tom solene, mostra a quase todos (só há duas exceções) que seu caminho é irremediavelmente o inferno, tendo em vista a vida que levaram.
Os mortos representam classes ou categorias sociais, como o Fidalgo, arrogante e falso; o Onzeneiro (usurário), explorador dos outros; o Sapateiro, ladrão de seus fregueses; o Frade, que vem acompanhado de sua amante; a Alcoviteira (cafetina), que fornecia moças para homens de dinheiro e poder; o Judeu, contra quem, refletindo preconceito da época, até o Diabo demonstra prevenção; o Corregedor (juiz) pomposo e corrupto; o Procurador, desonesto como o juiz; o Enforcado, que acreditava que a forma por que morrera lhe garantiria a ida para o céu...
Só são aceitos pelo Anjo o Parvo (idiota), camponês explorado e sofredor, e quatro cavaleiros que morreram em defesa da fé de Cristo.
Nesse desfile de almas, temos um amplo quadro crítico da sociedade portuguesa da época, apresentado em versos de enorme encanto -versos ágeis e refinados, que não se afastam da linguagem falada daquela época, em seus diversos registros.

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