São Paulo, quarta-feira, 6 de novembro de 1996
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Banda é o segredo da origem do tudo

JOSÉ MOJICA MARINS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Vou falar sobre algo que conheço bem; afinal são 33 anos que meu personagem milita entre as forças do mal, que formam o batalhão da escuridão.
Tenho sempre pautado minhas atividades "puxando a sardinha" para o lado da juventude, pois creio firmemente que é dela que se forjará o futuro de nosso país.
Mas vamos lá; através dos tempos tivemos os arautos da destruição e relatores das mazelas humanas. É uma tarefa árdua, que requer olho clínico, coragem e, acima de tudo, uma garra monumental para enfrentar o sistema, criticando seus erros.
Vou falar de um fenômeno mundial, no campo da música. O grupo Sepultura é a prova viva do vigor e capacidade de realização dos jovens de valor.
Tudo começou com um batalhador criativo que, em nome de seu grupo, embarca em um navio cargueiro, em direção ao Primeiro Mundo. Ele comeu o pão que o diabo amassou, mas consegue o reconhecimento internacional.
Ratazanas de esgoto, morcegos vampiros, insetos peçonhentos, sapos e cobras uniram-se aos fantasmas na ode ao grupo que personificou o lado obscuro da sociedade, embalado pelo toque de silêncio, de um clarim distante, tendo a marcha fúnebre como pauta condutora de um novo som.
Multidões se prostram, pois o nome do Brasil ecoa aos quatro cantos do mundo, com o grito de guerra do Sepultura. Com certeza os alienígenas brindam a isso com néctar. Atingiram a juventude em sua essência, na veia.
O rock do Sepultura transporta ao Armagedon, ao caos, aos caminhos soturnos do inferno de Dante; bem como reedita, de maneira atualizada, os acordes de Wagner.
Não entendo de música, não sou crítico, mas sei o que me toca na alma.
A música destes prodígios também mexe com minhas vísceras, me faz pensar que, como o "Zé do Caixão", o grupo informa e chama a atenção dos jovens de que o mundo está num estado lastimável. E precisa ser mudado.
Iludem-se aqueles que pensam que o Sepultura é apenas mais um bando de rapazes barulhentos. Se assim fosse, não teriam o reconhecimento de verdadeiros ícones do rock internacional, como Ozzy Osbourne.
Noto outra similaridade entre o grupo e eu, José Mojica Marins. Tivemos que primeiro conquistar o mundo, para depois sermos reconhecidos em casa.
Tudo bem. A vida é assim; nós da terceira força aqui estamos para enfrentar todas as adversidades. E lutar contra o marasmo e a passividade.
Andreas, Max, Paulo e Igor; fica aqui a saudação de um homem que, como vocês, está em sintonia com o que rola em nosso mundo, ciente de que sempre existirá algo mais que possamos fazer para melhorá-lo.
Em tempo, para aqueles que dizem que vocês deveriam divulgar a cultura brasileira, pergunto se eles já ouviram alguns de seus trabalhos envolvendo berimbaus, batucadas e nossos índios. Vade retro, mediocridade!

O cineasta José Mojica Marins, 65 ("não confirmados"), conhecido como Zé do Caixão, tem seu nome entre as dedicatórias do álbum "Roots"

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