São Paulo, quarta-feira, 6 de novembro de 1996
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A queda de Jatene

FERNANDO RODRIGUES

Brasília - Jatene caiu. Nessas ocasiões é bom recapitular comportamento daquele que sai.
Médico exemplar e bom orador, Jatene tira proveito máximo da desinformação da classe média. Usa o raciocínio utilitário do "eu queria fazer e não deixam". Guardadas as devidas proporções, age como Jânio Quadros no triste episódio da renúncia.
Inteligente, Jatene sabe que nenhum dos 158,6 milhões de brasileiros teria coragem de ser contra o investimento de mais dinheiro na saúde. Nessa toada, pedia dinheiro.
Saiu ontem do Ministério da Saúde dizendo que o governo é insensível. Quem vai dizer que não? Num país que convive com Caruarus e clínicas Santa Genoveva, quem se atreve a dizer que o governo faz um bom trabalho na área de saúde?
Jatene sabe que ninguém vai ficar contra ele quando pede mais dinheiro para a saúde. E joga com isso. São argumentos muito fortes.
Para quem retruca, o arguto ex-ministro ia logo dizendo que o Brasil gasta apenas US$ 132 per capita com saúde por ano. E que esse valor é de US$ 2.763 nos EUA, US$ 1.869 na França e US$ 1.538 no Japão.
Mas Jatene também deixa de falar muita coisa. Não diz que o Chile gasta só US$ 100 per capita com saúde e tem uma taxa de mortalidade de 17 crianças para cada 1.000 nascidas vivas. E que, na Colômbia (US$ 50 per capita), essa taxa é de 23 para 1.000.
No Brasil, com os seus US$ 132 per capita, a taxa de mortalidade infantil é bem maior que a do Chile e a da Colômbia. Aqui morrem 58 crianças para cada 1.000 nascidas vivas.
Esses números revelam duas coisas. Primeiro, que Chile e Colômbia gastam pouco com saúde. Segundo, que, mesmo gastando menos dinheiro que o Brasil, esses países conseguem ter alguns indicadores melhores.
É isso que derrubou Jatene. Ele, que fala que o governo não tem sensibilidade -com razão, muitas vezes-, acabou morrendo pela boca.
Faltou a Jatene sensibilidade para administrar a escassez.

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