São Paulo, segunda-feira, 11 de novembro de 1996
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Entidade carioca busca jovens desaparecidos

MÁRIO MOREIRA
DA SUCURSAL DO RIO

Revoltados com as mortes dos filhos, vários pais de adolescentes assassinados criaram entidades para lutar pela punição dos culpados e evitar o aparecimento de novos casos no Estado do Rio.
A mais famosa dessas entidades é a Associação das Mães de Acari (bairro pobre da zona norte), formada pelas mães de 11 adolescentes desaparecidos de um sítio em Magé, no dia 26 de julho de 1990.
Segundo o testemunho da dona do sítio, cuja identidade a polícia mantém em sigilo, um grupo de homens se dizendo policiais apareceu no local pedindo dinheiro.
Em seguida, os homens disseram que os adolescentes teriam de ir a uma delegacia e os obrigaram a entrar em dois carros. Até hoje, nenhum dos oito rapazes e três moças foi encontrado.
"Num primeiro momento, é insuportável, não dá para conviver com a situação. O único jeito que encontrei de superar foi insistir nas buscas", diz Marilene de Souza, 44, mãe de Rosana de Souza Santos, que estava no grupo de Magé.
Rosana tinha 18 anos quando desapareceu. Ela cursava o segundo grau e estava tratando dos documentos para começar a trabalhar no comércio.
"Minha vida inteira vai ser procurar a minha filha, até encontrar. Sempre há uma esperança", afirma Vera Lúcia Flores, 48, mãe de Cristiane Leite de Souza, outra desaparecida.
Com 16 anos, a menina trabalhava como manequim e ajudava a família financeiramente.
"O pessoal do prédio onde eu morava exigiu que saísse, por causa das ameaças que recebi depois que comecei minha luta", conta Vera Lúcia. Ela se mudou, com os quatro outros filhos, para a casa de um irmão.
"As autoridades não nos respondem nada. Como somos de uma comunidade carente, há esse descaso", diz.
Exceção
Coincidência ou não, o assassino de João Paulo Avelar Alves de Oliveira, morto no dia 24 de abril de 1994, Clayton dos Santos Maia, cumpre pena de 17 anos de prisão desde setembro do ano passado.
"Sinto vergonha de dizer que foi uma exceção", diz Vera Lúcia Alves, mãe de João Paulo, referindo-se à demora costumeira na solução desses crimes.
O menino, de classe média alta, foi morto com um tiro em Cabo Frio, na Região dos Lagos, quando esperava um ônibus para Búzios, com um grupo de amigos, na praça principal da cidade.
Maia passou correndo atrás de uma mulher com quem tivera uma briga num bar e se irritou ao esbarrar num dos rapazes. Puxou o revólver e matou João Paulo.
Afavi
A revolta levou a mãe a largar o trabalho como administradora financeira e se juntar à Afavi (Associação dos Familiares e Amigos de Vítimas de Violência), entidade que presta assistência a pessoas na mesma situação.
"O que provoca esses casos é a certeza da impunidade, já que a vida não tem valor para a maioria das pessoas. Não é preciso razão para matar, elas matam por nada."
Vera Lúcia acredita que a ausência de João Paulo jamais será superada. "Tenho quatro outros filhos, um marido e uma neta para cuidar, mas é como se faltasse uma perna ou um braço. Você sobrevive sem eles, mas sente muita falta."
Como consequência, ela vive em permanente sobressalto. "Todos os filhos têm celular e, quando saem à noite, avisam a que horas vão chegar. Mas eu sempre programo o despertador para acordar no horário e ver se está tudo bem."

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