São Paulo, quarta-feira, 13 de novembro de 1996
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Autópsia não foi definitiva

WILLIAM FRANÇA
DO ENVIADO ESPECIAL

Há vários fatos curiosos envolvendo a história da suposta morte de Lampião. Um deles é que sua cabeça ficou 30 anos, seis meses e nove dias insepulta, aguardando pronunciamento da Justiça.
Só foi enterrada em fevereiro de 1969, no cemitério Quinta dos Lázaros, em Salvador, depois que a Presidência da República (governo Costa e Silva) o indultou.
Durante todo esse tempo, foi exibida para estudantes e curiosos. E só foi submetida a um exame necrológico quatro dias depois do degolamento em Angico.
O autor da única autópsia feita na cabeça, José Lages Filho, do IML de Maceió, registrou que o estado em que a recebeu -em decomposição, quatro dias após ser decepada, e com um tiro que atravessou o crânio- impediu que ele fizesse "um estudo acurado".
Por isso, ele só sugeriu no laudo que ela pertencesse a Lampião. Lages Filho escreveu: "Em resumo, embora presentes alguns estigmas físicos na cabeça de Lampião (...), faltam deformações e outros sinais aos quais tanta importância emprestava caracterização do criminoso nato". A Fundação Joaquim Nabuco tem cópia do laudo.
Mas o fato mais estranho, que assustou até familiares de Lampião, foi o irmão do cangaceiro, Ezequiel, ter reaparecido vivo em 1984 na cidade de Juazeiro (CE).
A história registrava que ele, que também era cangaceiro, havia sido morto em 1926, numa emboscada.
Ezequiel usava o nome de Francisco e só revelou sua identidade ao buscar em Serra Talhada (PE) documentos para aposentar-se.
Personagens remanescentes do cangaço foram taxativos ao afirmar que só um irmão verdadeiro de Lampião saberia responder questões que ele respondeu.
Ezequiel contou à época (ele morreu em 1987) que em 1926 desistiu de continuar no banditismo.
Negociou com o Rei do Cangaço e, quando houve uma morte no bando, o irmão, Lampião, fez com que as roupas fossem trocadas entre o cangaceiro morto e Ezequiel, que ganhou dinheiro suficiente para fugir e mudar de vida.
Segundo o relato, foi feito um enterro simulado. A prática de simulação de enterros foi uma constante no bando de Lampião. "Ninguém sabia o nome verdadeiro de ninguém. Todo mundo só tinha apelidos", disse o ex-cangaceiro Candeeiro. Esse recurso era usado para dar a impressão de que o bando era invencível e nunca perdia homens nos confrontos.
(WF)

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