São Paulo, quarta-feira, 13 de novembro de 1996
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Biografia de Garrincha é liberada

RONI LIMA
DA SUCURSAL DO RIO

Por dois votos a um, desembargadores da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio liberaram ontem a venda do livro "Estrela Solitária", biografia do jogador de futebol Garrincha escrita pelo jornalista Ruy Castro.
"Fico contente porque é um marco na defesa da liberdade da criação literária e também da reconstituição da história. O povo brasileiro tem o direito de conhecer a sua história e a história de seus heróis", disse Ruy Castro.
O livro vendeu 45 mil exemplares até ter sua venda proibida, há um ano, pela mesma 2ª Câmara Cível, que concedeu liminar a mandado de segurança impetrado pelos advogados das 11 filhas -de mães diferentes- de Garrincha. Ontem, o mandado foi derrubado.
Na próxima semana, o livro deverá estar à venda em livrarias do país.
Danos morais e materiais
Um dos advogados das 11 filhas de Garrincha, Luis Eduardo Salles Nobre, disse que a família do jogador não pretende recorrer da decisão judicial de ontem.
Nobre disse que importa agora esperar o resultado da ação que corre na 42ª Vara Cível do Rio, em que as filhas do jogador reivindicam, da editora Companhia das Letras, indenizações -a serem calculadas- por supostos danos material e moral.
Para Nobre, o livro ofenderia a honra de Garrincha, ao revelar suposto "troca-troca" sexual que ele teria feito na infância com amigos em sua cidade natal, Pau Grande (RJ). "Para dizer que você é homossexual, tem que provar", afirmou.
O advogado reclama também que foram publicadas no livro 150 fotos do atleta sem autorização das filhas. Como herdeiras, segundo ele, elas teriam que autorizar a publicação das fotos.
Um dos advogados da editora, Manuel Alceu Affonso Ferreira, 53, considera o pleito descabido. Segundo ele, essa autorização não seria necessária, pois as fotos foram recolhidas em arquivos de jornais e já haviam sido publicadas.
Por outro lado, o advogado não vê como uma referência a um suposto "troca- troca" na infância de Garrincha poderia ser associada ao homossexualismo. "Conheço vários machões que tiveram esse tipo de experiência", disse.
Leve referência
Para o escritor Castro, a livro faz apenas "uma leve referência à possibilidade de "troca-troca". Por isso, segundo ele, a reivindicação do advogado das filhas de Garrincha só demonstraria "o seu desespero".
A filha de Garrincha Maria Cecília, que encabeça a ação, não foi localizada ontem. Mas ela já criticou em outras oportunidades a biografia por supostamente retratar o pai como alcoólatra, mulherengo e por informar qual seria o tamanho de seu pênis.
Para o desembargador Roberto Maron, que votou pela manutenção do mandado de segurança que impedia a venda do livro, é público e notório que Garrincha bebia muito. Mas em relação ao suposto homossexualismo, isso teria que ser provado.
Vitória da Constituição
O advogado da editora acha que o resultado de ontem representou "a vitória da Constituição", que estabelece o direito à liberdade de criação e também o direito à honra de uma pessoa.
Para que esses dois direitos sejam exercidos, Ferreira defende que não haja censura prévia a uma obra e que aqueles que se sentem prejudicados possam reivindicar na Justiça a reparação de um suposto dano.

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