São Paulo, sexta-feira, 15 de novembro de 1996
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Pitta, candidato de laboratório, deve ser o 1º negro eleito prefeito de SP

MAURICIO STYCER
DA REPORTAGEM LOCAL

Um homem que até ontem havia vencido apenas uma eleição, disputada em chapa única, para síndico do prédio onde mora, deve se consagrar hoje como o primeiro negro a ser eleito prefeito da maior cidade da América Latina.
O carioca Celso Roberto Pitta do Nascimento, 50, chega a esse posto graças a uma surpreendente série de acasos e a uma inédita estratégia de marketing político.
Há quatro anos, quando Paulo Maluf partia para uma vitória fácil em cima de Eduardo Suplicy (PT) no segundo turno da eleição municipal paulistana, Pitta ainda nem pensava em política.
Sua contribuição àquela eleição resumiu-se a um voto -o voto fiel do diretor financeiro da Eucatex (Pitta) no irmão (Paulo Maluf) do presidente da empresa (Roberto).
Uma semana após a eleição, quando Maluf colocou no papel os nomes de todos os futuros secretários, Pitta continuava muito longe da política: o seu nome não constava da lista dos futuros assessores.
"Nem o Roberto nem a minha mãe, que infelizmente já tinha falecido, deixariam eu tirá-lo da empresa", diz hoje Paulo Maluf.
A resistência de Roberto Maluf, se houve, começou a ser colocada à prova em 21 de novembro de 92.
Nesse dia, a Folha noticiou que o futuro secretário de Administração, o empresário Abram Szajman, era dono de uma empresa que mantinha relações comerciais com a Prefeitura de São Paulo.
Quando Szajman desistiu, em 3 de dezembro, Maluf escolheu Celso Pitta para o cargo.
"Você vai ter um pequeno prejuízo. O salário da Eucatex é melhor", disse Maluf a Pitta, ao fazer o convite, que foi aceito.
Três dias antes da posse, Maluf teve de contornar um novo imprevisto. José Augusto Savasini, futuro secretário das Finanças, comunicou que não poderia assumir o cargo por problemas de saúde.
Em 30 de dezembro de 92, então, Maluf noticiou que Pitta seria o secretário das Finanças do governo.
Coringa
"Pitta não ia ser secretário e foi. Não ia ser prefeito e foi. Era um coringa para o jogo. O momento e a oportunidade podem valer muito mais que uma carreira certinha", diz o deputado federal Arnaldo Faria de Sá (PPB-SP), que foi secretário dos Esportes de Maluf.
Escolhido para cuidar do cofre da prefeitura por suas qualidades profissionais (era uma pessoa de "ultraconfiança" da família, nas palavras de Paulo Maluf), Pitta mostrou como secretário das Finanças algumas qualidades de político profissional: capacidade de ouvir mais do que falar, frieza e facilidade para tomar decisões.
Essas características não bastariam para fazer de Pitta o candidato de Maluf à sua sucessão. Há muitas histórias a esse respeito.
O caso mais curioso envolve a gravação de uma fita de vídeo, no qual os pré-candidatos malufistas tiveram três minutos para se apresentar e depois se submeteram, individualmente, a uma sabatina feita por jornalistas contratados.
O desempenho dos pré-candidatos nessa fita foi analisado por especialistas norte-americanos em marketing -que não entenderam nada do que foi dito, mas perceberam que Pitta tinha qualidades acima da média diante das câmeras.
Antes de anunciar o nome do escolhido, Maluf convocou todos os pré-candidatos e pediu que assinassem um documento se comprometendo a apoiar quem fosse o eleito. Só o deputado federal Ricardo Izar (PPB-SP) se recusou.
Reza a lenda que, realizados todos os testes, Maluf ficou entre Pitta e Lair Krahenbuhl, secretário de Habitação (projeto Cingapura).
Os dois passaram uma imagem boa na TV e eram vistos por eleitores potenciais como nomes novos, sem os vícios dos velhos políticos.
Para explicar por que o prefeito se decidiu por um em detrimento do outro, pessoas próximas a Maluf arriscam várias explicações -até a de que o sobrenome de Lair Krahenbuhl seria um ponto fraco por ser de difícil repetição.
Outra explicação é a de que Pitta, por ser negro, contribuiria para melhorar a imagem de Maluf -mesmo perdendo. "Ele foi escolhido porque, na avaliação, era o melhor: o melhor em TV, o melhor em discurso, o melhor em presença física", diz Maluf, insistindo no caráter científico de sua escolha.

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