São Paulo, quarta-feira, 20 de novembro de 1996
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A largada na modernização dos portos

MARCELO AZEREDO

A lei nº 8.630/93, de modernização dos portos, nos coloca diante de grandes desafios: reformular o sistema de gerenciamento das operações e da mão-de-obra, eliminar as interferências corporativas e burocráticas e aproveitar, de forma mais racional, os espaços e as instalações. A história de quase 70 anos de centralização no sistema portuário brasileiro nos deixa um legado muito pesado, caracterizado basicamente pelos custos logísticos elevados, baixíssima qualidade de serviços e estreita capacidade de investimento do Estado brasileiro para posicionar os portos no calibre de uma economia globalizada.
Para chegar à meta de maximização das vantagens do porto, há que trilhar um novo modelo gerencial, cuja espinha dorsal se estrutura na descentralização ou regionalização das decisões estratégicas, na divisão das funções administrativas e operacionais, passando pela "desmonopolização" e consequente implantação de um ambiente concorrencial, tanto entre os portos regionais quanto dentro de cada um deles. É preciso que se garantam condições de tratamento equânime a todos os usuários dos nossos terminais marítimos, evitando-se a cartelização e o fomento de novos monopólios.
Se buscarmos exemplos de portos modernos, como, por exemplo, o de Roterdã, o maior do mundo, veremos que eles trabalham basicamente com a idéia de aumentar o fluxo de navios, implantar modernas tecnologias operacionais e buscar linhas de financiamento para novas construções.
O modelo de Roterdã, estruturado para administrar o aluguel dos terminais privativos e assegurar a entrada de navios da forma mais fácil e segura, é revolucionário. Ali, com cerca de 800 empregados para os encargos burocráticos, as empresas privadas proporcionam 70 mil empregos diretos e 380 mil indiretos. Ao longo de seus 45 quilômetros de cais, recebe, anualmente, mais de 30 mil navios e 200 mil embarcações. Trata-se de um megaprojeto de gestão de terminal marítimo, que deve inspirar as administrações que pretendem avançar rumo às mudanças.
No porto de Santos, começamos a desenhar uma nova etapa no sistema portuário. Contrariando as expectativas de muitos, inclusive previsões negativas da mídia, o processo de modernização vai sendo implantado aceleradamente. Por meio da negociação e da participação ativa de todos os segmentos envolvidos com a administração e as operações, duas dezenas de etapas já foram vencidas. Os trabalhadores de capatazia, somando cerca de 18 mil, estão sendo transferidos para o Órgão de Gestão de Mão-de-Obra (OGMO). Esperamos que o modelo, em sua plenitude, seja implantado nos próximos meses.
É claro que os passos dados são absolutamente necessários, mas não suficientes para que todos os objetivos sejam alcançados, beneficiando os usuários finais. Deveremos envidar todos os esforços para evitar que o monopólio estatal seja substituído por monopólio ou oligopólio privado. Nesse sentido, o Conselho de Administração Portuária (CAP) deve agir como poder moderador, conciliando os interesses de todos os segmentos. Não podemos deixar que esses riscos ameacem o processo de modernização. A criação e a consolidação de um verdadeiro ambiente concorrencial e a participação permanente de usuários e suas respectivas entidades na condução do processo serão fatores essenciais para o desenvolvimento de todo o programa.
No caso de Santos, há que garantir que todos os arrendatários e operadores estejam subordinados ao CAP, com suas requisições de mão-de-obra feitas diretamente ao OGMO. Como todo início de um grande empreendimento, certos efeitos colaterais são sentidos, porém precisam ser enfrentados com determinação. A nossa crença é a de que o processo em implantação é irreversível. Afinal de contas, temos de adaptar nossa realidade às novas logísticas da globalização, às metas de ganhos de produtividade, de redução dos custos das operações e à estratégia de desconcentração operacional.
A reordenação e o aperfeiçoamento da matriz modal dos transportes, em nosso país, passa, necessariamente, pelo sistema portuário. A inadequação do binômio transporte-porto faz com que o Brasil deixe de exportar cerca de R$ 5 bilhões, por ano, enquanto sabemos que, para cada R$ 1 bilhão exportado, são gerados entre 60 mil a 70 mil empregos. Os nossos portos, é sabido, apresentam custos ainda muito altos. Mas a vontade política, a união de governo, empresários e trabalhadores, a disposição administrativa de renovar métodos e processos e a inserção dos nossos portos na escala concorrencial certamente propiciarão a redução de um forte componente do chamado custo Brasil.

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