São Paulo, terça-feira, 26 de novembro de 1996
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Courtney Love abandona o luto e volta à perversão

ELAINE GUERINI
EM LOS ANGELES COURTNEY

Courtney Love, 31, retoma a imagem de garota pervertida. Depois de atravessar um longo período bancando a viúva bem-comportada (de Kurt Cobain, o ex-líder do Nirvana), a cantora americana vive nas telas uma stripper bissexual viciada em drogas.
Em "The People vs. Larry Flynt" -com estréia marcada para o dia 27 de dezembro nos EUA-, Courtney interpreta a mulher que inspira o empresário vivido por Woody Harrelson a lançar uma revista pornográfica. Mais magra e com os cabelos tingidos de castanho escuro, a líder da banda Hole recorre às já conhecidas poses escandalosas.
Esse é seu primeiro papel de destaque no cinema -depois de pequenas atuações em "Sid e Nancy", "Basquiat" e "Feeling Minnesota". Para a Columbia Tristar, que lança o filme no Brasil em março, o novo trabalho deixa a cantora com chances de abocanhar uma indicação ao Oscar.
A imprensa americana aproveita o seu conturbado histórico para afirmar que Courtney apenas interpreta ela mesma na tela. "A única coisa que eu tenho em comum com a personagem é a necessidade de me expressar", disse a atriz em entrevista exclusiva à Folha, concedida no hotel Four Seasons, em Los Angeles.
Courtney chegou meia hora atrasada e foi logo mandando sua secretária dizer que não falaria sobre questões pessoais (leia-se Kurt Cobain). Na hora da entrevista, a cantora ainda se recusou a falar sobre drogas -sendo que Althea Leasure, sua personagem no filme, é uma viciada em heroína.
Vestindo preto, com blusa decotada e saia longa justa, passou todo o tempo fumando e roendo as unhas pintadas de marrom. Abaixo, os principais trechos da entrevista.
*
Folha - O que leva uma estrela do rock a virar estrela de cinema?
Courtney Love - Acho que, no meu caso, foi uma necessidade desesperada de chamar atenção (risos). Quando eu era criança, gostava de brincar de representar. Acabei me dedicando à música e formei uma banda, mas nunca esqueci esse desejo de ser atriz.
Mas admito que não consigo me ver como uma estrela de cinema.
Folha - Como tem recebido as críticas, que diz que você faz o seu próprio papel na tela?
Love - Gostaria de dizer: "Podem ir em frente e dizer o que bem entenderem". Mas não é verdade. Isso incomoda. De qualquer forma, reconheço que a liberdade de expressão é importante. Só não concordo com o que a imprensa diz sobre minha atuação.
Assumo que me interessei pela Althea justamente por se tratar de um papel adequado para mim. Sempre soube que não seria difícil fazê-lo. O papel cresceu muito nas minhas mãos e isso ninguém sabe.
Folha - Como se preparou para viver Althea Leasure?
Love - Como o roteiro é inspirado em uma história real, conversei com muitas pessoas que conheceram Althea, inclusive o Larry Flynt (Althea morreu de Aids em 87, aos 33 anos). Também li tudo sobre ela que saiu na imprensa. O que mais me impressionou foi saber que ela assistiu ao assassinato dos avós quando era criança.
Folha - Sentiu-se insegura ao ser dirigida por Milos Forman (de "Amadeus")?
Love - No começo me senti intimidada, principalmente sabendo que outras atrizes tinham sido cogitadas para o papel antes de mim. Tudo acabou dando certo. Forman é famoso por deixar os atores à vontade, até para improvisar.
Folha - Assim como acontece com Flynt e Leasure na história, seu comportamento também já foi considerado ofensivo. Isso a motivou para fazer o filme?
Love - Sim. Acho que essa nova geração esqueceu a importância da liberdade de expressão e o filme enfoca isso. Quando se fala sobre esse assunto as pessoas acham que é coisa de hippie. Mas o tema não podia ser mais atual. Ainda hoje nem todo mundo entende quando uma mulher diz o que pensa ao tocar sua guitarra, por exemplo.
Folha - Apesar de tratar de pornografia, o filme traz poucas cenas ousadas...
Love - Não é um filme erótico. Forman sempre dizia nas filmagens que abordaríamos o assunto sem cair na pornografia propriamente dita. Mas não me importaria de filmar cenas mais ousadas.
Folha - Como você vê sua possível indicação ao Oscar?
Love - Nunca pensei que algum dia ouviria uma loucura parecida.
Folha - Sua carreira no rock corre o risco de ficar em segundo plano?
Love - De jeito nenhum. Ninguém me pediu para parar de cantar. Só paro se algum dia isso acontecer.

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