São Paulo, quinta-feira, 28 de novembro de 1996
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Dúvidas emergentes

ELEONORA DE LUCENA

São Paulo - Caderno especial da Folha dissecou, ontem, o fenômeno da entrada de parte dos pobres no mercado de consumo. Desde o Real, mais 13 milhões de brasileiros fizeram fila nos crediários em busca de fogões, geladeiras, aparelhos de som.
De olho apenas no valor das prestações, aceitaram juros indecorosos: num país em que a inflação está entre 10% e 13% ao ano, pagaram taxas entre 100% e 125% na média.
Escaldados com os planos anteriores, os novos consumidores não viram alternativa. Quiseram levar logo o que podiam, talvez temendo turbulências no futuro.
Esse movimento, comparável ao que ocorreu no Plano Cruzado, acabou se refletindo na indústria, no comércio, nas importações. Ele já dura meses. O que não se sabe é o fôlego que ele tem.
O desemprego continua elevado e a alardeada queda na taxa de juros segue tímida. Volta e meia a inadimplência dá um salto, e crescem as dúvidas sobre o futuro desse novo mercado emergente.
Foi o que aconteceu na primeira quinzena deste mês. Os carnês de crediário em atraso aumentaram 19,2% em relação ao mesmo período no ano passado. Na cidade de São Paulo, existem 3,5 milhões de carnês atrasados -número 405% superior à média histórica.
É possível que o pagamento de parcela do 13º salário, amanhã, modifique essa situação e reduza a inadimplência. Mas há alguns números que tiram o brilho da análise que identifica um superaquecimento hoje. A venda de carros novos, por exemplo, caiu 20% na primeira quinzena do mês.
Metade dos imóveis alugados na capital paulista estão sendo devolvidos. Motivo: os inquilinos não têm como pagar. Deixam bairros mais nobres e partem à procura de espaço nas regiões periféricas. Lá, onde estão os mais pobres, o aluguel está em alta.
Isso sem falar em balança comercial negativa, déficit público, dívida interna. Questões que deixam em aberto a permanência dos pobres no fabuloso mundo do consumo.

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