São Paulo, sexta-feira, 29 de novembro de 1996
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"Ouro de Artista" discute ornamento

CELSO FIORAVANTE
DA REPORTAGEM LOCAL

Beatriz Milhazes expõe a partir de hoje na Casa Triângulo. Leda Catunda e Rosângela Rennó também. A galeria de Ricardo Trevisan mostra ainda Iran do Espírito Santo, Caetano de Almeida e Edgard de Souza.
Mas isso não significa que a galeria Camargo Vilaça esteja perdendo suas mulheres ou a Luisa Strina, seus homens. Trata-se apenas de uma mostra que representa um aparte na fogueira das vaidades que queima nas artes plásticas contemporâneas no país, já que seu objetivo é maior que o mercado: arrecadar fundos para que o Projeto Leonilson termine a catalogação da obra do artista e produza um CD-ROM sobre o trabalho.
Para isso, foi confeccionada uma série de 50 bronzes, que serão vendidos a R$ 400 e duas séries de gravuras (R$ 300 e R$ 450). Também estarão à venda sete desenhos e três pinturas do artista. Houve ainda doação de obras de artistas e cessão de parte da comissão do galerista para a entidade.
Sob a curadoria do crítico Felipe Chaimovich, a Casa Triângulo reuniu 22 artistas, alguns até sem galeria, para a mostra "Ouro de Artista", que pretende discutir como um dos elementos da obra do artista plástico Leonilson -o ornamento- também perpassa as obras desses artistas.
"Não se trata de uma mostra sobre Leonilson ou sua influência sobre outros artistas, mas um diálogo de sua obra com outras produções. Não o vejo como um pai de outras gerações e não quis fazer uma exposição de causa e efeito. Me ative a um aspecto pouco visto, mas relevante para a discussão da arte contemporânea no Brasil", disse o curador.
Essas ressalvas são bem-vindas por ser realmente difícil ver relações -exceto as afinidades pessoais- entre as obras de Beatriz Milhazes, Gilberto Vançan, Rochelle Costi ou Carlito Contini e Leonilson (1957-1993).
Cabe ressaltar ainda que, embora não se trate da procura vã de novos Leonilsons, é possível ver em alguns trabalhos a discussão de temáticas semelhantes, como sentimento, intimidade, impossibilidade e resignação.
Maurício Ianês, por exemplo, trabalha com um auto-retrato fotográfico coberto por paetês.
Ao mesmo tempo que os paetês estabelecem uma forte relação com um discurso religioso, já que servem para dar uma idéia de valor aos mantos religiosos, eles também se relacionam com o profano, evidenciado em sua utilização na moda e no Carnaval. Os paetês servem assim para sublimar verdades inefáveis, ligadas à fé e ao desejo.
Essas questões aparecem ainda quando Ianês se fotografa com a boca aberta, mas com um recurso que lhe tira dentes e língua. Ianês trata da impossibilidade de discursos que são íntimos e, portanto, indizíveis, como a verbalização da fé e da arte.
Além da grande quantidade de artistas presentes, a mostra ganha mais interesse pelo número de trabalhos inéditos, alguns produzidos para a própria mostra, como o de Courtney Smith.
Em seu pequeno vestido branco em tecido antigo, mais que ao ornamento, a artista remete a temas mais constantes na obra de Leonilson, como memória e intimidade, dois dos "ouros do artista", também presentes no minúsculo e rigoroso óleo sobre tela de Valdirlei Dias Nunes.
"A grandeza da obra de um artista está no fato de ele poder dialogar com outros", disse o curador.
Rosângela Rennó, Leda Catunda, Sandra Cinto, Dora Longo Bahia e Rochelle Costi também apresentam trabalhos inéditos.

Mostra: Ouro de Artista Artistas: Coletiva com obras de Ana Maria Tavares, Beatriz Milhazes, Caetano de Almeida, Carlito Contini, Courtney Smith, Daniel Acosta, Dora Longo Bahia, Edgard de Souza, Gilberto Vançan, Iran do Espírito Santo, Leda Catunda, Leonilson, Marcelo Krasilcic, Marcelo Zocchio, Maurício Ianês, Mônica Nador, Nina Moraes, Rochelle Costi, Rosângela Rennó, Sandra Cinto, Sérgio Romagnolo, Valdirlei Dias Nunes
Curadoria: Felipe Chaimovich
Onde: Casa Triângulo (r. Bento Freitas, 33, tel. 011/220-5910, Centro)
Vernissage: hoje, às 21h
Quando: até 14 de dezembro

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