São Paulo, sexta-feira, 29 de novembro de 1996
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Unidos na esperança

PEDRO CHEQUER

O Dia Mundial de Luta contra a Aids foi instituído pela Organização Mundial de Saúde em 1988, com o objetivo de unir todos os povos em torno da consciência da necessidade de lutar juntos contra o vírus da imunodeficiência humana, o HIV, e contra o preconceito ao portador do vírus e da doença, por meio da promoção da solidariedade.
A cada ano, e esta já é a nona campanha mundial, é escolhido um tema que melhor espelhe a atualidade da temática e a força que significa uma resposta universal à epidemia.
Este ano, no dia 1º de dezembro, estaremos todos "unidos na esperança", tema da campanha de 1996. É importante refletirmos sobre essa pequena frase, que conjuga duas idéias fundamentais: união e esperança.
A esperança não virá apenas do descobrimento de novos medicamentos ou vacinas, embora fatos recentes, como os avanços obtidos com os anti-retrovirais, signifiquem uma importante vitória. Neste momento, é a nossa disponibilidade para a troca de experiências bem-sucedidas e resultados promissores pelos diversos programas de prevenção e controle da Aids existentes no mundo que nos fortalecerão no aprimoramento das nossas ações, para o melhor alcance dos nossos objetivos, e nos ajudarão a definir uma política global para a epidemia.
No Brasil, por exemplo, o Programa Nacional de Doenças Sexualmente Transmissíveis/Aids desenvolve suas atividades em três áreas fundamentais: prevenção, assistência e vigilância epidemiológica, além da especial ênfase ao desenvolvimento institucional de órgãos públicos e privados, parceiros do governo federal na implementação das políticas públicas de DST e Aids.
A área de prevenção ocupa-se das políticas, estratégias e projetos específicos de atividades que são, comprovada ou potencialmente, as mais eficazes para se evitar a transmissão do HIV. Nesse sentido, alguns segmentos sociais merecem uma atenção especial, por apresentarem maior risco de infecção. É o caso das populações indígenas, de homens com múltiplas parcerias, homens que fazem sexo com homens, usuários de drogas injetáveis, profissionais do sexo, populações confinadas, garimpeiros e caminhoneiros, dentre outros.
Devido às condições especiais requeridas na assistência aos doentes de Aids, essa é uma área de grandes desafios para qualquer sistema público de saúde. No Brasil, já há centenas de hospitais credenciados para o atendimento aos pacientes. Entretanto, mostraram-se necessários serviços alternativos, que a complexidade biológica, psicológica e social da doença exige. A resposta a essa demanda veio com a implementação de dezenas de unidades de hospitais-dia, serviços de assistência especializada e de assistência domiciliar terapêutica.
A epidemiologia da Aids identificou o primeiro caso no Brasil em 1980. Passados 15 anos desde o início da epidemia entre nós, já computamos 88.099 casos, dos quais 50% já foram a óbito. A região Sudeste ainda concentra o maior número de pacientes e as maiores taxas de incidência. Também é majoritária na proporção acumulada de 75% dos casos já notificados no Brasil. Embora 2.192 dos cerca de 5.000 municípios brasileiros já tenham registrado casos de Aids entre os seus habitantes, os índices mais altos são encontrados nas grandes concentrações urbanas.
A Aids, como todos sabemos, não escolhe sexo, idade, raça ou classe social. Entretanto, a evolução da epidemia tem apontado algumas tendências, como o crescimento da infecção entre as mulheres. A razão homem/mulher entre os casos notificados, que em 1984 era de 44 homens para 1 mulher, hoje é de apenas 3 homens para 1 mulher.
Finalmente, é particularmente relevante o fortalecimento das instituições de saúde pública envolvidas em atividades de prevenção e controle de DST e Aids. Nesse sentido, gostaria de mencionar que importante projeto vem sendo desenvolvido para estabelecer pela primeira vez no país o controle de qualidade dos testes laboratoriais para o diagnóstico das DSTs e do HIV executados pela rede pública.
Mesmo com os progressos alcançados em vários setores e níveis de atuação, ainda há muito por fazer para reverter o avanço da Aids.
O Programa Nacional sempre acreditou que isso é possível. A epidemia já mostra sinais de estabilização em determinados subgrupos populacionais, fruto, sem dúvida alguma, da adoção de medidas preventivas. Para consolidarmos as ações do programa, necessitamos de uma ampla aliança solidária, da qual participe toda a sociedade. Quando pudermos contar com a dedicação e o empenho de todos, poderemos controlar a Aids no Brasil.
A grande lição que a Aids está a nos ensinar e a nos lembrar no dia 1º de dezembro é a de que o espírito de união e o sentimento de esperança que cultivarmos sobreviverão à epidemia. Estamos absolutamente certos disso.

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