São Paulo, segunda-feira, 2 de dezembro de 1996
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Câmara vota atendimento a aborto legal

CYNARA MENEZES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ) deve aprovar nesta terça-feira o projeto que garante atendimento público e gratuito ao aborto legal -previsto no Código Penal para os casos de estupro e risco de vida da mãe.
Uma pesquisa feita pelo CFemea (Centro Feminista de Estudos e Assessoria), entidade ligada ao movimento de mulheres, revela que 31 dos 50 membros da comissão são favoráveis ao aborto legal.
Apenas um membro da CCJ, o deputado Gérson Peres (PPB-PA), se manifestou contrário porque, disse à Folha, não concorda com a redação do projeto. Os demais parlamentares não responderam ou não quiseram definir posição.
Se aprovado na CCJ, o projeto, que já passou pela Comissão de Seguridade Social e Família, vai ser apreciado pelo Senado.
Sete dias
Apesar de não estar previsto no Código Penal, a maioria dos hospitais públicos exige hoje uma decisão judicial para fazer o aborto legal, impedindo muitas vezes o aborto por superar as 12 semanas até quando a gravidez pode ser interrompida.
"Na verdade, isso é uma decisão de governo", diz o diretor do Hospital Materno-Infantil de Brasília, Lucas Cardoso Veras, onde, desde agosto, foram realizados oito abortamentos legais, a maioria em gravidez por estupro.
O hospital foi liberado pelo governo do Distrito Federal (PT) para fazer essa espécie de cirurgia. O primeiro a ser liberado foi o Hospital Jabaquara, em São Paulo.
O método utilizado em Brasília é o de sucção ou aspiração, com um aparelho cedido por uma organização norte-americana. Não há necessidade de anestesia geral e não causa problemas para uma futura concepção, ao contrário da curetagem (raspagem do útero).
As vítimas também contam com acompanhamento psicológico e assistencial. "É incrível, mas a gravidez causa muito mais sofrimento a elas que o próprio estupro. Esse é um dado novo para nós", disse Veras.
Alguns médicos, porém, alegam "problemas de consciência" e não executam a cirurgia. O hospital criou um grupo voluntário só para atender os casos de aborto legal.
Para a socióloga Sônia Malheiros, assessora do CFemea, a apresentação do projeto, "pela lógica", não seria necessária se o Código Penal fosse cumprido.
"É redundante, porque desde 1940 o aborto legal está assegurado. Mas é um reforço importante, porque muitas vezes a burocracia é tão grande que a mulher estuprada acaba dando à luz antes de sair a decisão judicial sobre o aborto".
Segundo a socióloga, a Igreja Católica tem sido a maior oponente da prática do aborto legal na rede pública de saúde.

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