São Paulo, segunda-feira, 2 de dezembro de 1996
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Sede do festival aceita peixe como entrada

ERIKA SALLUM
ENVIADA ESPECIAL A BÚZIOS

Há três anos, a cidade de Búzios, no Rio de Janeiro, ganhou sua primeira e única sala de cinema, a Gran Cine Bardot e, com ela, o Búzios Cine Festival.
Por trás dessas conquistas culturais, está o argentino Mario José Paz, que, de tão cinéfilo, resolveu construir seu próprio cinema.
Apaixonado pela sétima arte desde os tempos em que morava em Buenos Aires, sua vida sempre esteve ligada à telona.
Quando menino, seu pai o levava para assistir a duas, três sessões por dia. "Não sei se era para se livrar de mim por algumas horas. Cresci com o John Wayne."
Para ele, morador do município desde 1978, só faltava uma sala de projeção para que Búzios se tornasse um paraíso perfeito.
"Não queria mais ter de ir ao Rio de Janeiro para assistir a filmes. Meu sonho era vê-los aqui na minha cidade", contou Paz.
Em sua busca frustrada por financiamento, descobriu que teria de bancar o projeto sozinho.
A saída foi pedir um empréstimo de R$ 120 mil à pousada da qual é dono, passando a dever a si mesmo. Parte dos R$ 200 mil -custo total do Bardot- conseguiu com a ajuda de amigos.
"Cada uma das 111 poltronas da sala tem o nome da pessoa que a financiou."
Para completar a realização de seu sonho teve uma idéia: "Por que não promover também um festival de cinema?".
Ajudado pela equipe da mostra Rio Cine, conseguiu que a sala de exibição fosse inaugurada junto com o Búzios Cine Festival, evento anual que terminou no sábado.
Não é somente durante a mostra de cinema que o Gran Cine Bardot apresenta uma diversificada programação.
No resto do ano, dois longas-metragens são exibidos a cada semana, e todo mês há duas pré-estréias. Ele mesmo escolhe os filmes, em geral, não comerciais. "Mas isso não é regra. Se a obra tiver qualidade, exibo."
A cobrança de ingressos é uma capítulo à parte: a comunidade de pescadores tem 50% de desconto nas entradas.
Além disso, Paz promove um tipo de escambo (troca direta de mercadorias, sem dinheiro) com os habitantes da cidade. Qualquer peça de artesanato pode ser trocada por bilhetes do cinema.
"Não é por falta de dinheiro que alguém vai deixar de assistir aos filmes."
Por conta disso, ele possui uma enorme coleção de barquinhos, quadros, enfeites etc.
"Se aparecerem por aqui com peixes, também farei a troca", acrescentou.
Mesmo com essas facilidades, ele admite que a maioria do público é composta pelas classes média e alta de Búzios e pelos turistas.
Segundo Paz, o Bardot fica repleto de gente nos finais de semana. Apesar disso, a sala não consegue pagar seus gastos, e a dívida com a pousada já chega aos R$ 70 mil.

A repórter Erika Sallum e o fotógrafo Otávio Dias de Oliveira viajaram a convite da organização do festival.

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